Frederico Pires Bolacha, funcionário do ministério da Agricultura, é uma dessas figuras masculinas de encantadora ingenuidade. Não há ninguém mais simples. Não há coração mais puro. Não há espírito menos eivado pela maldade.
Existe, porém, um Deus, que protege as crianças e os singelos de coração. E foi essa entidade invisível, mas real, que tomou à sua conta o Frederico, orientando-lhe os passos, e guiando-o, generoso, quando ele tratou de escolher mulher. Só, mesmo, Deus, ou o acaso, poderia reunir uma alma como a do Frederico a um coração inocente como o da Carlotinha Broxado.
O casamento desses dois anjos foi como o dos mortais comuns: convidados, flores, presentes, e, à noite, jantar em família. Após o jantar, as danças; e após as danças, a alcova nupcial, com todas as suas conseqüências.
Não obstante a sua inocência e, mesmo, por ter pertencido à repartição de estatística, o Frederico Bolacha conhecia perfeitamente a aritmética dos Evangelhos, na parte em que o Senhor manda crescer, e multiplicar. Pelo menos, o seu primeiro cuidado, ao recolher-se com a Carlotinha, consistiu em dispor os algarismos, para tirar a prova real, nove meses depois.
A Carlotinha é que não gostou, nada, da operação aritmética. Franzina e fatigada com as emoções do dia, mal o marido acabou de dispor os números, ergueu-se, com uma horrível dor na cabeça, que parecia lhe querer arrancar os miolos:
— Coitada da minha mulherzinha! — fez, amoroso, o Frederico.
E com aquela estupidez inocente, que foi, na vida, o segredo de sua felicidade:
— Você não está acostumada... Não é, filhinha?