1Fez-se a segunda jornada
da comédia, ou comedia,
que inda nos deu melhor dia,
do que a jornada passada:
vimos a mesma selada,
e de vinho a mesma cópia,
de ovos maior cornucópia
que a de Almatéia florida,
e sendo a mesma comida,
contudo não era a própria.

2Já Pedro esperava adrede
da culatra tão sarnento,
que embalançando-se ao vento
era um cação em rede:
versos a matéria pede,
me disse a sua lazéria,
e se os faço com miséria,
não se espante, quem os lê,
de que tanta sarna dê
(se é podre) tanta matéria.

3Cantou-se galhardamente
tais solos, que eu disse, ô
que canta o pássaro só,
e os mais gritam na semente:
tocou-se um som excelente,
que Arromba lhe vi chamar,
saiu Temudo a bailar,
e Pedro, que é folgazão
bailou com pé, e com mão,
e o cu sempre num lugar.

4Pasmei eu da habilidade
tão nova, e tão elegante,
porque o cu sempre é dançante
nos bailes desta cidade:
mas em tal calamidade
tinha Pedro o cu sarnudo,
que dando de olho, ao Temudo
disse pelo socarrão,
assim tivera o cu são,
como tenho o cu sisudo.

5Pôs-se a mesa, e escabelos,
foram seguindo-se os pratos,
que eram tanto à vista gratos,
como ao gasnate eram belos:
Pedro se pôs a lambê-los,
e dando-se a Berzabu
de não beber com Jelu
o licor, que o entorpeça,
porque o que dá na cabeça,
temeu, lhe desse no cu.

6Não quis o cu inflamar,
por isso bebeu só água,
do que nós com grande mágoa
nos pusemos a chorar:
este fim teve um folgar
de tanto gosto, e alinho,
de que eu colho, e esquadrinho
a exemplo da vida breve,
que quem rindo o vinho bebe,
chorando desbebe o vinho.