V
Passado e Presente
Eu gosto de evocar as épocas distantes
Em que Febo doirava os ídolos gigantes.
O homem e a mulher, cheios de mocidade,
Gosavam sem embuste e sem ansiedade,
E, exercendo o vigor dos seus músculos de aço,
Protegia-os o Céu do tédio e do cansaço.
Cibela, que era então fértil e generosa,
Mostrava os filhos seus, contente e orgulhosa;
E o leite grosso e bom do seu colo trigueiro
Amamentou, feliz, o universo inteiro.
O homem, belo e forte, era o modelo vivo
Do rei da creação, generoso e altivo;
Frutos esculturaes, sem mancha, a apetecer
A carne rija e san beijar-lhes... e morder!
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O Poeta, se hoje em dia intenta recordar
As grandezas de então, quando vê perpassar
A nudez da mulher e a miséria do homem,
Sente que o frio e a dôr a alma lhe consomem
Ante o quadro brutal que lhe magôa a vista.
Que monstros, que aleijões! Que trágica revista!
Que pobres troncos nus! Que fórmas, que feitios!
Tristes corpos sem côr, magros, gordos, esguios,
Que o deus utilitário, implacável e nobre,
A nascença, envolveu em coeiros de cobre l...
E vós outras, mulher’s, da palidez dos círios,
Corróe a podridão vossos corpos de lírios;
Sofreis a expiaçãc dos vícios maternaes,
E aos filhos transmitis as pústulas que herdaes!
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É certo que mostrar podemos ao Passado
As creações gentis que temos inventado:
Cancros no coração, dôr d’alma, languidez,
E outras belezas mais deste mesmo jaez!...
Mas estas produções de líricos dementes
Não podem impedir que os povos decadentes
Prestem á mocidade a homenagem devida,
— Á mocidade san, robusta, comedida,
A fronte dominal, o olhar iluminado,
E derramando a flux, sobre este descampado,
Como o azul dos céus, como as aves e a flor,
Suas canções viris, seu perfume e calor!