Num recolhimento sugestivo, como se o meu espírito estivesse longinquamente a orar n’alguma velha abadia, penetrei na catedral em festa.

Não sei que de nevoento, vago, dolente e nostálgico me invadira de repente e por tal forma, que eu fui, como que sonambulamente, à solenidade.

Todo o templo, ornamentado, resplandecia, numa imponência, numa augusta suntuosidade, a que o grande esplendor das luzes dava majestades romanas.

A onda humana, compacta, densa, murmurejava, numa compunção.

Alvuras e incenso envolviam, como que em brumas imaculadas, em flocos matinais de neblina, o vasto recinto da igreja.

Lustres imensos pendiam pomposamente da abóbada branca, numa infinidade de pingentes que tiniam e cintilavam, como polidas, facetadas lâminas metálicas, num brilho molhado.

Do coro, para o alto, os instrumentos de corda choravam, salmodiavam, num crescendo de notas, através do vivos metais sonoros.

Eram excelsos, eram egrégios aqueles sons sacros, religiosos, que subiam pelas naves, à maneira que os incensos subiam.

No peito, como numa urna de cristal, o coração batia-me, anelante, na ânsia, na vertigem de vê-la por entre todo aquele confuso e amplo borboletar de cabeças.

E, quando houve um alegre e diamantino tilintar de campas e o sacerdote elevou no cálix o Vinho Sagrado, o coração, como estranho pássaro de sol, fugiu-me do peito, num alvoroço arrebatado, maravilhado na grande luz do templo, em busca dos olhos dela, que, de repente, me fitaram, longos, negros e veludosos, quando, por entre níveas névoas d’incenso, o Gloria in Excelsis, exalçando os Evangelhos, triunfava nas vozes e levantava um festivo rumor no templo.

E foi, para meu coração lancinado de amor, como se Ela, naquele instante, me trouxesse toda essa Glória luminosa nos olhos.