CAPITULO XV.
Os adagios são a sabedoria das nações, e resumem a experiencia das gerações passadas. (*)
ECONOMIA DOMESTICA E AGRICOLA.
Se a ventura buscaes - no campo mora!
O lavrador, antes de sahir de casa, deve pensar no que vai fazer, e quando recolher para ella deve recordar e assentar o que fez.
Sem contabilidade não ha empreza agricola que seja regular. Lavoura sem contas é navio sem agulha. Conta de sacco é conta de pouco mais ou menos: é a ruina do lavrador.
Durante o dia aponta na tua carteira o que á noite has-de lançar no teu livro de razão. N'uma pagina as entradas, na opposta as sahidas: de modo que o balanço se possa verificar n'um momento.
Trata bem o teu cão, que é o sentinella do teu cazal - o teu cavallo, que são as tuas pernas - as tuas juntas, que são a força do teu braço - os teus gados, que são, depois de Deos, a tua providencia - todos os teus animaes, que são ou os companheiros dos teus trabalhos, ou os fornecedores da tua casa, - e até mesmo o teu gallo, que é o teu despertador e o relogio de aldeia.
Se tratares os teus criados como teus companheiros, com bondade e sem altaneria; e não como escravos, com imperio e dureza, elles te olharão como seu pai, e não como seu tyranno. E então trabalharão com gosto; isto é, trabalharão bem e dobrado.
(*) Escusado é dizer que a maior parte destes adagios ou os aprendemos da bocca do povo, ou na lição dos livros; e que uns são reproduzidos pela nossa memoria, outros colhidos de diversos authores, e outros finalmente o resultado da nossa meditação. Não se nos diga que roubamos os adagios, porque não se rouba o que é de todos.
442
Não trates a ninguem com desprezo - perdoa-se tudo, mas o desprezo nunca.
Estabelecei com firmeza a ordem nos trabalhos, e o habito a entreterá.
Sede prudente, activo, perseverante e economico. Amai a vossa familia para que ella vos ame a vós; e para que vos ajude contente nas lidas agrarias, e nos desgostos domesticos.
O trabalho e a actividade são o entretenimento dos pobres - o ocio e o enfado o açoite dos ricos.
Não penseis que o rico é mais feliz que o remediado.
Se souberdes mandar saber-vos-hão obedecer. Contra-ordens poucas; e podendo ser nenhumas.
Nunca digas que sabes fazer aquillo que nunca fizeste.
O lavrador deve na sua casa ser o ultimo que se deite e o primeiro que se levante. O que se levanta tarde, cedo lhe anoitece. Tudo faz confusamente e mal.
A preguiça tudo acha difficil; a diligencia tudo torna facil.
A ordem produz trabalho e economisa tempo. Quando cada cousa tem um logar, e cada pessoa sua occupação, andam os afazeres da granja tão regulares como as rodas de um relogio.
O lavrador que trabalha com ordem fatiga-se pouco e adianta muito; o que trabalha sem ella fatiga-se muito e adianta pouco.
Raras vezes é bom começar o que não podemos acabar. Poupa as forças dos moços e dos animaes.
Não desperdices o tempo, e aproveita o vento. O tempo não transige com quem o despreza. O vento é vario como a fortuna.
A preguiça gasta a vida como a ferrugem consome o ferro. Inda cança mais que o trabalho. Anda de companhia com a miseria.
O preguiçoso, por não dar uma passada, tem fadiga triplicada.
Não ha fardo mais pezado que a preguiça; nem molestia maior que a ignorancia.
Apressa-te lentamente, porque a precipitação nada faz bem. Poupa as forças e o dinheiro.
Mais faz a vista do amo do que as suas mãos. Appareça de improviso onde o não esperam. Louve e reprehenda a tempo. Ensine com o exemplo. Abra o primeiro rego; póde a primeira arvore, para que ganhão e o moço conheçam que o entende; e assim ganhará maior força de anctoridade.
Se queres cedo empobrecer, traz trabalhadores e não os vás ver.
Sê economico. - Mas olha que a economia está em gastar tudo o que é necessario, e nada do que é superfluo. A economia é a primeira qualidade do agricultor - do que é rico para não empobrecer - do que é pobre para não morrer de miseria. Quem guarda acha.
443
Queres achar um thesouro? Ganha o que puderes, e guarda o que ganhares.
Conta sempre com o peior; mas depois de aberto o ultimo sulco levanta os olhos e o pensamento para Deos, para que abençôe o teu trabalho!
Sê perseverante: é virtude rara entre nós, que temos mais coragem de acção que de soffrimento. - O lavrador que desmaia com os obstaculos, que se impacienta com as contrariedades, esquece que a sua profissão é a mais aventurosa de todas, porque depende de um grande concurso de circumstancias, quasi sempre vagas e indefinidas.
Uma discreta perseverança quasi tudo alcança.
Não confundas a perseverança com a pertinacia. Persevera o que insiste em aperfeiçoar um methodo bom - ateima o que insiste n'uma rotina má e viciosa.
Faze o teu dever, succeda o que succeder.
Quem pede prestado vai buscar uma humilhação. - Pedi ao meu visinho e envergonhei-me, vim para casa e remediei-me.
Perdoai alguma cousa aos vossos subordinados. Quem não perdôa não é digno de perdão.
Antes a consciencia do remediado do que o thesouro do opulento.
Se o vosso visinho fôr mais velho e entendido do que vós, pedi-lhe conselho - Se não fôr dai-lho, se vo-lo pedir.
Não vos queixeis dos vossos visinhos. Os máus queixam-se de todos; os bons de poucos; e os melhores de ninguem, ou de si proprios.
Os bons conselhos são avisos do Céo. As boas lembranças são como a aves de arribação. Se logo as não apanhâmos póde ser que nunca mais voltem.
Dize! - O que has-de gastar na taberna não é melhor gastal-o em casa? E o tempo que alli perdes não vale mais ganhal-o na horta? Maldita taberna! que é o sumidouro do teu dinheiro, e do teu tempo, que é mais que o dinheiro, e da tua saude, que é mais que o tempo!
Tem cuidado em teus filhos! - Os vicios são como as más hervas; renascem até que se extirpam.
Que os teus filhos saibam ler para se aconselharem com os bons livros, que aconselham bem e de graça! - Como não é agradavel, reunida a familia em torno do lar, em longa noite de inverno, ouvir com curiosa attenção a historia dos santos patriarchas, a narração das proezas de nossos honrados e valentes paes, a exposição de praticas agricolas, melhores do que as vossas, e mesmo a leitura destas linhas que vos estou dedicando! Fazei, bons lavradores, fazei com que vossos filhos saibam ler, escrever e contar; porque esta é a primeira porta do saber.
444
Não habiteis logar doentio. Que é o que póde pagar a vossa saude e a da vossa familia?
Convem antes guardar um segredo do que dál-o a guardar.
O trabalho paga as dividas, e a ociosidade as contrahe.
Quem seu visinho despreza suas calumnias provoca.
Tres cousas lançam o camponez fóra de casa - o fumo, a goteira, e a mulher trameleira.
Não folgues na taberna, nem bebas nella - é do teu vinho que deves beber - é no teu lar que deves folgar.
Casa o filho quando quizeres, e a filha quando puderes.
Trata as mulheres com as mesmas cautelas com que colhes as rosas.
Um bom livro é uma excellente companhia.
O verdadeiro bem não se encontra senão no socego da consciencia.
Não ha repouso mais doce do que o que se compra com o trabalho.
Affastai-vos do homem colerico porque a colera é um mal contagioso.
A colera começa pelo delirio, e acaba pelo arrependimento.
Não disputeis com o homem apaixonado, porque a paixão não deixa nem ouvir, nem discorrer.
Mais fere a má palavra do que a espada afiada.
A soltura das palavras conduz á soltura das acções.
Póde-se com as palavras enganar os homens: a Deus nunca.
Os homens julgam o coração pelas palavras, e Deos julga as palavras pelo coração.
Aquelle que aprende a ler no rosto dos homens raras vezes se engana.
Ha phisionomias que á primeira vista logo agradam, e ha outras que repellem.
Assim como ha flores para todas as estações, ha prazeres para todas as idades.
O sol doura a quem o vê, o sabio illumina a quem o ouve.
Ha tres generos de homens insupportaveis - o pobre soberbo, o velho namorado, e o rico mentiroso.
Vida do campo, paz de espirito - amor do campo, amor da virtude.
Compra na feira e vende em casa.
O que paga adiantado é servido de máu grado.
A esperança é o pão da pobreza.
A porta do teu casal Nunca bata o pobre em vão - Quer Deus que partas com elle Do teu tecto e do teu pão!
Por Deos! Acautela-te dos falsos mendigos!
445
Tende sempre de reserva algum dinheiro, porque nunca faltam na granja occasiões repentinas de empregal-o.
Faze o teu dever, e succeda o que succeder.
TERRAS, LAVORES, E ADUBOS.
O tempo é mercê de Deos: Mas o lavor e os adubos Provêm dos cuidados teus.
A terra sabe pagar A quem a sabe lavrar; Não tem melhor devedor O pobre do lavrador.
Ou fabrica o teu cerrado, Ou então tral-o arrendado.
No solo barrento Areia é estrume.
Corrige o filho é a terra.
Quem tarda muito em lavrar Pouco ha-de encelleirar.
O estrume não é santo, mas faz milagres.
As tempestades purificam o ar e adubam a terra.
Quem mal lavra pouco ceifa.
Pelo S. Matheus pega do arado e lavra com Deus.
Quem não lavra quando póde Não o faz sempre que quer.
Começa e acaba tudo a tempo.
A terra não se faz velha, Faz-se velho o lavrador; Cança o boi, ella não cança, Se lhe poupam o vigor.
Mais se adiantam os trabalhos de campo com a diligencia do que com o dinheiro.
A campo fraco lavrador forte.
Mais produz culta tapada Que herdade mal amanhada.
Mata a sede á terra, que ella te matará a fome.
Os erros do agricultor nascem da ignorancia, como os insectos da corrupção.
Bom estrume e bom lavor Traz tudo que é um primor.
A vista do dono aduba os campos.
446
Não desejes vastas terras Que não possas cultivar; Pouco enfeixa e pouco aperta Quem muito quer abarcar
Arrenda a vinha e o pomar, Se o quizeres desgraçar.
Queres pasmar teu visinho? Lavra, sacha, monda o campo, E esterca-o no S. Martinho.
Terra quanta vejas; Vinha quanta podes; Casa quanta mores.
Mais vale uma vista do dono do que cem brados do abegão.
Encherás os teus celleiros Se tiveres bons lameiros; Nunca esperes ter bons gados Se não tiveres bons prados.
Semêa a avêa a fugir, E a cevada a dormir.
Põe na vinha bons barbados; Pede a filha a paes honrados.
Pelo S. Martinho prova o teu vinho, No cabo do anno já não te faz damno.
Quem planta no outomno Leva um anno de abono.
Dia de S. Lourenço vai á vinha e enche o lenço.
«Não é o que se semêa que produz, é o que se esterca.
«A terra cança-se e esterilisa-se produzindo sempre a mesma novidade.
«Quem mais semêa menos colhe. Quem muito abarca pouco abraça.
«Se queres seara cultiva prados.
«O pão emmagrece a terra; o prado dá-lhe alento e substancia.
«Os prados são forragem; a forragem alimenta o gado; o gado faz estrume, e o estrume produz mantimento.
«Toda a terra de pão póde ser de prado. Ha mais especies de prados do que de cereaes.
«Quem prados não semêa pouco trigo ceifa: ou pequena estrumeira pequeno celleiro.
«O exemplo é o melhor dos mestres. Préga com o exemplo e não perderás palavra.
447
«Quem sempre lavrar tudo não trará calções de velludo. Quem não tiver prados pouco trigo colherá.»
(Thiago Bujault.)
GADOS E ANIMAES DOMESTICOS.
Não ha lavoura sem gados, nem boa lavoura sem muitos gados.
Os melhores productos do campo são os gados.
Bom gado e bom lavor São minas do agricultor.
Gado ruim nem abona, nem ajuda o agricultor. Boa mantença ao teu gado, que elle te dará a pago.
Vacca triste e pansuda nem presta nem muda.
Anda a pé, e nunca o acha Quem quer cavallo sem tacha.
Tanto monta não ter gado, Como tel-o mal tratado.
Carne de sovão, Comer de glotão.
Cabrito de um mez, Cordeiro de tres.
Aceado ou não, Tudo engorda o sovão.
Se a comida te não chega vende uma parte do gado. Mais vale pouco e bom que muito e máu.
Pensos substanciaes e a tempo, repouso, pouca luz, menos bulha, e nenhum desgosto, são condições necessarias á ceva dos gados.
Os animaes domesticos não querem só sustento; querem tambem afagos - castigos poucos, e nunca injustos - bom ar na alpendrada, e cama aceada - mantença e trabalho a tempo - resguardo do frio e vento.
Cuidai bem dos animaes que vos ajudam a ganhar a vida, que vos dão forças, carne, leite, manteiga, queijo, lã, pelles, estrumes, e no fim dinheiro, quando os levais á feira, sendo o mais certo que podeis haver para pagar rendas e criados.
Mal vai ao lavrador que não fôr criador.
Sem gado lanar pouco has-de medrar.
«Qual o animal tal o estrume. Boi magro estrume fraco; boi gordo estrume grosso. A qualidade do penso no estrume se vê... Gado a monte ou no pasto estrume não faz. O pouco comido em casa farta, e ainda depois no estrume dá a paga. Trabalhai, lidai, esfalfai-vos; sem bois no curral nunca sereis nada... Com a cama ganha e cresce a estrumeira, e tambem o animal, que dorme quente e folgado.»
29
448
(Agricultor Michaelense.)
ESTAÇÕES E PROGNOSTICOS.
Chuva miuda e nevoa aturada São pingue alimento de terra lavrada.
A melhor rega é a que vem do céu.
Tempo frio e ennevoado Aduba o alqueive e o prado.
Bom tempo no inverno, Máu tempo no estio - Máu anno de fome. Bom anno de frio.
Anno de neve, Paga o que deve.
Se o inverno não erra o caminho Têl-o-heis no S. Martinho.
Mez de janeiro e fevereiro Ou enche, ou vasa o celleiro.
Dos Santos ao Natal Inverno natural.
Em abril agoas mil.
Março ventoso, abril chuvoso.
As agoas dos nossos rios devem regar os nossos campos.
As agoas dos nossos rios, Que ao mar vão por nosso mal, Valem inda mais que as rendas Do fisco de Portugal.
Demora nas terras altas A chuva que nellas cahe; Toda a substancia da terra Do ar e da agoa sahe.
Boa noite apoz máu tempo Traz depressa ou chuva ou vento.
Quando o ganso mergulha Traz o trigo p'ra tulha.
Sapo que salta Agoa não falta.
Não affirmes que o dia foi bello antes de chegar a noite - não affirmes que o homem preencheu bem a sua carreira antes de chegar ao seu termo.
449
MAXIMAS GERAES.
«Nossos ascendentes eram barbaros, a quem o christianismo ensinou até a arte de se nutrirem.
«O espectaculo de muitos milhares de religiosos, cultivando a terra, minou pouco e pouco os prejuizos barbaros, que ligavam um certo desprezo á arte que nutre os homens. O camponez aprendeu nos mosteiros a fabricar e a fertilisar o solo.
«A religião não quer que o dia da oração, em que se pedem a Deos os bens da terra, seja um dia de ocio. Com que esperança se não enterra o arado no sulco depois de ter implorado aquelle que dirige o sol, e que guarda nos seus tesoiros os ventos do meio dia, e as tepidas chuvas.»
(Chateaubriand.)
«O trabalho e o pão faltam frequentes vezes aos obreiros das cidades, mas nunca áquelles que não abandonam a terra. Os salarios dos artistas são mais elevados; mas as occasiões de despezas são numerosas, ao passo que as necessidades dos cultivadores são limitadas.
«Desde que a instrucção fôr mais geral nos campos, o trato dos camponezes se tornará mais agradavel; elles se honrarão da sua profissão; lerão com fructo; e em pouco tempo a pratica e a theoria, rectificando-se mutuamente, lhes darão esse espirito judicioso de observação, sem o qual a agricultura não póde ser bem succedida.»
(Emile Girardin.)
«A sciencia deve completar e regularisar os conhecimentos impiricos; ella deve coordenal-os e reunil-os áquelles que ella póde por si propria fornecer - é assim sómente que se hão-de chegar a obter conhecimentos solidos, por meio dos quaes se possa ao mesmo tempo dirigir a pratica e esclarecer a theoria.»
(Conde de Gasparin.)
«Áquelles que consideram os trabalhadores como puros instrumentos de trabalho; que os tem como machinas automaticas que servem á creação das riquezas agricolas, diremos com Sismondi - que a felicidade destes homens deve ser o fim principal da sciencia e da politica, porque elles formam uma grande parte das nações; devendo por isso conservar-lhes das riquezas que elles fazem nascer aquella maxima parte que fôr conciliavel com a continuação do seu trabalho. - É preciso, portanto, proporcionar-lhes mais commodidades, tornando-os mais moraes, e mais intelligentes.
29 *
450
«Aquelle que cultiva melhor a terra é tambem o que a defende melhor. Os bons lavradores são sempre os melhores soldados.»
(Dupin ainé.)
«Bons prados são um thesouro n'uma granja; máus prados são a vergonha da granja e do agricultor; prados mediocres são um fardo para a agricultura.»
(Schwertz.)
«É necessario, sobre tudo, que os proprietarios se costumem a ver tirar lucros das suas fazendas, e a não exigir senão uma porção desses lucros: sem isto o rendeiro não teria nenhum interesse em effeitual-os.»
(De Dombasle.)
«Cultivadores ricos, em logar de fazer daquelles de vossos filhos que dão mais esperanças medicos, advogados, mercadores, curas e artistas, fazei-os cultivadores, depois de lhes haver dado uma boa educação preliminar, não de grego e latim, mas dos conhecimentos que tem relação com a cultura da terra!»
(L'Agronome.)
«Não forceis a natureza em cousa alguma, nem na fadiga do corpo, nem na do espirito, nem mesmo nos prazeres licitos. Sêde sobrio e moderado; sabei acabar onde o excesso começa. Sabei retirar-vos ousadamente em face do perigo. Entregar-se a um prazer á custa da saude é perder o direito de se queixar quando se estiver doente. Entregar-se a um prazer, cujo estigma ha-de passar em herança aos filhos, é commetter um infanticidio anticipado.
«Sêde desinteressados, francos e leaes no amor, na amisade, e nos negocios. A dissimulação e a cubiça são vermes roedores do mais nobre de nossos orgãos... O mentiroso e o velhaco soffrem ainda mais do que aquelles a quem fazem soffrer. Não se vive tranquillo e são senão com a verdade.»
(Raspail.)
«A agricultura domina a industria manufactureira com toda a superioridade das obras de Deos sobre as obras dos homens.
«Cultivando a terra, o homem tem a consciencia da sua propria fraqueza; elle sabe que tem necessidade da clemencia do céo, do calor do sol que amadurece os seus trigos, da fecundidade da chuva que os banha.
«Ha nas emanações da terra uma especie de bondade, e de saude moral, que se communica áquelles que a amam e cultivam.»
(Journal des Debats.)
451
«Uns lavram a terra por necessidade, outros por luxo, e outros por calculo. Para os primeiros é um officio, para os segundos um passatempo, e para os ultimos uma especulação.
«A lavoura que não deixa lucros é esteril. A que entra pelo capital é ruinosa. E a que vive de emprestimos no meio de apuros e esperanças frustradas está ferida de morte.
«O capital, elemento de toda a producção, é tão necessario na agricultura como a mão para executar, e o entendimento para dirigir. Uma especulação agricola não é mais do que uma operação industrial.
«A agricultura está mais adiantada onde maiores capitaes se dedicam a ella... A escacez dos capitaes não póde supprir-se senão até certo ponto, e ha-de ser economisando, trabalhando, e acertando mais.»
(D. Alexandro Olivan.)
«Nenhum trabalho simples é tão ricamente compensado pelos productos como a actividade material do homem applicada com intelligencia á agricultura... Quanto mais energicas forem as forças da natureza tanto mais consideraveis serão os lucros. Tambem nos paizes em que a mão d'obra é pouco abundante não se empregam na cultura senão os solos mais ferteis.»
(Thaer.)
Terminamos com uma historia verdadeira. -
«Houve outr'ora um lavrador pobre de torrão, mas d'entre os pobres abastado, antes opulento nas colheitas. Nem entre os rusticos faltam invejas; tantos fructos de tão acanhado solo quebraram os olhos aos visinhos; murmuraram, suspeitaram sortilegios e artes más, denunciaram-no aos comicios. Attrahe o povo a novidade da causa; apresenta-se o réo no meio do foro apinhado para o ver condemnar; lança diante dos juizes as alfaias das suas lides rusticas, e, apontando para ellas, para uma filha moça e robusta, que o acompanhava, e para uma formosa junta de bois, que diante trazia: = Juizes e cidadãos romanos, disse, aqui ponho diante de vós e do sol todos os feitiços que fecundam a minha herdade; só aqui falta o que, ainda que os Deoses quizessem, eu vos não podéra mostrar, que são as minhas madrugadas, os meus suores, e nossas diligencias de todo o anno. =»
Curso elementar de Agricultura de Raspail: traducção do Sr. Dr. Figueiredo.
FIM DO 2.º E ULTIMO VOLUME.
ADVERTENCIA.
DESEJANDO o auctor diminuir as imperfeições desta sua obra, e apresental-a o mais correcta que lhe fôr possivel nas futuras edições, convida todos os Srs. que tiverem cultivado a sciencia e a arte agricola, para que lhe remettam as suas observações quer confirmatorias, quer contradictorias, tanto sobre theorias, como sobre factos, que em qualquer dos casos serão recebidas com reconhecimento, e aproveitadas no interesse da nossa agricultura.