Hamlet: drama em cinco actos/Acto quarto/Cena II
Duvido que o encontrem.
Hamlet? senhor Hamlet?
De vagar. Que rumor é este? Quem ousa chamar Hamlet? Ah! eil-os que chegam. (Entram Rosencrantz e Guildenstern.)
Senhor? que fez vossa alteza do cadaver?
Entreguei-o ao pó de que saíu.
Mas em que logar para o podermos levantar e depositar na capella?
Não pensem em tal.
Que devemos, pois, pensar?
Que pouco me importo com a sua cabeça, mas muito com a minha. Interrogado de mais a mais por uma esponja! Que resposta lhe póde dar o filho de um rei?
É a mim que chama esponja?
A quem havia de ser? sim a ti, que bebes os favores, as recompensas e o poder real. Mas, no fim de contas, taes officiaes prestam ao monarcha relevantes serviços, são para elle como o fructo que o bugio conserva na bôca para depois o engulir; quando necessitar do que tem arrecadado, espreme-os como uma esponja, e ficarão completamente enxutos.
Não comprehendo, senhor!
Estimo muito. As palavras do traficante só tem por domicilio os ouvidos do tonto.
Diga-nos onde está o cadaver, e siga-nos á presença do rei.
Onde está o rei existe um corpo, mas o rei não está n'esse corpo. O rei é uma creatura.
Uma creatura, senhor?
Uma creatura que nada vale! Conduzam-me á sua presença. Vamos jogar as escondidas. (Sáem todos.)