1) PSICOTERAPIA, no sentido mais amplo da palavra, é todo e qualquer tratamento que vise influenciar e melhorar qualquer tipo perturbado de comportamento mental ou psíquico-emocional e os seus derivados psicossomáticos. Todo e qualquer tratamento que, primariamente, faça efeito terápico através do espírito-mente. Assim sendo, até um tratamento fisiológico, as drogas, o bisturi, os exercícios físicos, os banhos, a eletricidade, tanto quanto a própria psicanálise e o hipnotismo, podem considerar-se como outras tantas formas de psicoterapia.

Filodoto, famoso médico da antigüidade, teve uma paciente que se queixava amargamente de ter alojada no seu estômago uma serpente, nenhuma classe de prova podendo convencê-la do contrário.

Nesse caso, Filodoto diz a ela: "Bem, já que é assim, dar-te-ei um excelente vomitório, e quanto tudo o mais venha para fora, essa cobra não ficará lá sozinha. Sairá também".

E dito e feito. Tomado o vomitório, tudo saiu do estômago da doente, aparecendo inclusive no recipiente uma cobra vivinha e movendo-se que o médico colocara lá, naturalmente. Curara assim a sua doente aquele médico inteligente, com esse tipo de psicoterapia sugestiva, mesmo que tivesse que fazer uso de uma droga.

Hipócrates e Paracelso usaram, também, à semelhança de outros muitos, esses tipos de psicoterapia. E na Idade Média, o grande Mondeville aconselhava a seus colegas: "Médicos, curai os vossos doentes por qualquer método, pela música das violas e do saltério de dez cordas, ou por cartas preparadas descrevendo até a morte de seus inimigos ou contando ao doente ter sido eleito para um bispado, se for clérigo". Isto também era psicoterapia, e muitos outros métodos, como vimos nos primeiros capítulos deste trabalho.

Embora tenhamos definido a psicoterapia, em sentido estrito como um método de resolver os distúrbios psíquicos por métodos exclusivamente psíquicos, em sentido amplo, tudo quanto age primariamente através do espírito pode ser considerado como psicoterapia, não só a psicanálise, o hipnotismo, a crença religiosa, a reeducação, as drogas, o bisturi e a própria psiquiatria. Os mesmos "placebos", são, todos eles, excelentes remédios psicoterápicos, como o são os amuletos, os instrumentos religiosos, as rezas, os trabalhos da macumba e receitas dos curandeiros, etc., que formam, em comum, o enorme acervo da psicoterapia sugestiva.

2) A Higiene mental ou Psicoterapia preventiva: prevenindo e evitando a doença, estamos curando-a por antecipado. Como a medicina anti-infecciosa cura as doenças físicas, vacinando e educando o público a respeito de suas causas e sintomas, as medidas de preocupação para evitá-las, etc. Assim também, nós podemos educar o povo com relação às causas das neuroses e demais distúrbios psíquicos e psicossomáticos. Livros, conferências, jornais, associações de pais e professores, escolas, universidades, exército, hospitais, clínicas psicoterápicas, prisões, tribunais, sociedades de higiene mental, etc., esclarecimentos pela rádio e televisão, teatro e todos os métodos de propaganda, difundindo os princípios fundamentais da sanidade mental a fim de que todos saibam como evitar as situações da vida, bem como as atitudes e modos de encarar os problemas pessoais em face das demais pessoas. Pela instrução das crianças, dos pais e da juventude principalmente, a doença mental pode ser prevenida, tanto quanto o pode ser a doença física. Embora não tenham sido os psicanalistas os que lançaram esta campanha, os princípios da psicanálise estão em jogo, produzindo os seus efeitos saudáveis.

3) As doenças psicossomáticas e sua cura psicoterápica: foi um erro mantido durante vários séculos, e isto em nome da ciência, e de considerar o homem como um feixe ou soma de órgãos diversos, reunidos como nos mostra a anatomia, pois o homem é muito mais do que a soma de suas partes. Como a soma de hidrogênio e de oxigênio nos dá o resultado surpreendente de água-vapor, água-líquido e água-sólido, segundo as diversas temperaturas, assim um mesmo organismo humano vivo nos dará diversos resultados, segundo a temperatura emocional em que se encontrar. O homem, combinação de matéria e espírito (psiquismo-mente-alma), deve ser rotulado como algo infinitamente superior à soma de ambos.

Outro erro também multisecular e não menor que o primeiro, tem sido o de considerar esses elementos como simples, estanques, separados ou entidades diversas, funcionando ou podendo funcionar independentes uma da outra. As provas experimentais, entretanto, nos demonstram todo o contrário. O corpo é abrangido por todos os processos mentais ou psíquicos e o espírito é atingido por todos os processos corporais. E quando os dois se separam, nem o médico, nem o psiquiatra e nem o psicoterapeuta já não podem fazer nada, pela simples razão que o paciente já está morto.

Não existe isso que se chama doença mental ou corporal. Há apenas a doença e o doente, manifestando certos sintomas, ou predominantemente mentais ou predominantemente físicos. Na tuberculose são principalmente físicos e na neurose de angústia são principalmente mentais. Onde quer que a neurose ou demência precoce se origine, seja no nível fisiológico, ou no psicológico, não resta a menor dúvida que enormes conflitos interiores contribuíram para o colapso. A influência das situações difíceis da vida, sejam familiares, sociais ou ambientais, com suas pressões emocionais, inegavelmente parecem desempenhar um grande papel em todo tipo de moléstias. Há os espíritos frágeis, que cedem debaixo de uma pressão inabitual, e há os espíritos fortes, que conseguem resistir e não cedem; os espíritos frágeis são os que vão acabar nos hospitais ou no necrotério.

Devemos trabalhar, então, segundo o princípio de que o corpo e o espírito formam uma unidade indivisível. E de algum modo, isto está sendo demonstrado diariamente. Não podemos considerar o espírito como uma entidade diferente da entidade corpo, senão como um conjunto global que age unitariamente. A mesma endocrinologia, que no início parecia provar que as doenças mentais e emocionais provinham dos desarranjos glandulares, confessa hoje que tais desarranjos são ocasionados, freqüentemente, por fatores psíquicos e emocionais.

4) O Dr. Banting, o descobridor da insulina, fez interessantes experiências de laboratório, pregando sustos propositadamente em animais cobaias. E verificou que, quando os sustos eram instantâneos e muito grandes, se repetidos continuadamente por bastante tempo, terminavam por causar nas cobaias a angina pectoris, e conseqüentemente morriam. Isto porque a ação do susto chegava ao coração. A seguir utilizou cobaias as quais tinha cortado as fibras nervosas emocionais (nervo do vago-simpático no plexo solar — castração emotiva), ficando incapazes de sentir o medo, não ficavam assustadas e não podiam contrair a angina pectoris, não conseguindo matá-las por susto...

O rubor, as palpitações, impressão de sufocação, são outras tantas manifestações de como os conflitos emocionais afetam a pressão sangüínea e abalam o coração. De igual maneira o sistema respiratório pode ser influenciado pelas emoções. Um enamorado diante do outro (um emocionado na maioria dos casos) pode ficar até sem fôlego repentinamente e impedido de falar. Assim mesmo, o asmático entra rapidamente em crise, sempre que levemente emocionado.

Pode constatar-se facilmente como uma pessoa com bocio exoftálmico (distúrbio da tiróide) mostra olhos esbugalhados, pupilas dilatadas, fisionomia tensa e mãos trêmulas; a mesma figura de um ator representando um estado de medo, pavor, pânico, etc. Ditas pessoas padecem permanentemente de ansiedade, de medo e de nervosismo horríveis. Muitos soldados das guerras, nos grandes períodos de estacionamento em trincheiras e lugares de perigo continuado, mantendo-se inativos e esperando o pior a cada momento, terminaram destruindo completamente a tiróide por excesso de atividade devido ao medo, que desencadeou a superatividade de hormônios que a arruinaram. As duas coisas andam de mãos dadas: a superprodução da tiróide produz ansiedade, medo, inquietude, nervosismo, insegurança, neurose; e esta lista de emoções coloca a tiróide em superatividade, num círculo vicioso e destruidor.

E tudo isto já foi demonstrado até experimentalmente. Com pessoas artificialmente emocionadas (excitadas as emoções propositadamente) e registrando em aparelhos as suas reações de temperatura, respiração, secreções estomacais, etc., verificou-se que:

1) As emoções aflitivas de ansiedade, ressentimento, temor, sensação de culpa, preocupação, depressão, medo, insegurança, angústia, etc., libertavam uma quantidade anormal de ácido clorídrico livre, que nas pessoas nervosas causava indigestão nervosa.

2) As emoções explosivas de irritabilidade, ira, raiva, cólera, etc., libertavam também quantidades excessivas de ácido clorídrico corrosivo, contando com 50% de probabilidades de contrair úlceras no estômago e no duodeno.

Demonstrou-se ainda nestas experiências que o grau de intensidade da emoção marca o grau da quantidade de ácido clorídrico libertado, sendo que as emoções explosivas, normalmente, libertam o dobro do ácido do das aflitivas.

5) De onde se vê que um problema (incômodo), iniciado no nível psíquico-emocional, pode transformar-se rapidamente numa doença física, e vice-versa, uma doença física produzirá uma emoção aflitiva ou explosiva (um problema psíquico), que por sua vez seguirá aumentando a doença física, num círculo vicioso e continuado.

Diante disto, podem parecer-nos acadêmicas e totalmente fúteis perguntas como as seguintes: o órgão determina a função, ou a função determina o órgão? A esquizofrenia é causada por um distúrbio físico, que determina o estado doente de uma mente, ou é a mente do doente que determina e causa a doença do órgão doente? Pois tão cedo como num nível se origina um incômodo, este atinge imediatamente o outro. é portanto, perder um tempo precioso ficar a discutir se devemos ministrar bicarbonato de sódio a um doente que sofre de hiperacidez no estômago, ou se devemos ensinar-lhe a controlar as suas emoções. é claro que devemos fazer as duas coisas. Temos que tratar todos esses distúrbios fisiológicos-emocionais, tanto na frente fisiológica como na psicológica.

Eis o conceito da Medicina Psicossomática, o aspecto mais moderno da medicina dos nossos dias. Com base em provas, como as experiências relatadas e outras, tem-se como doenças originadas por causas psíquico-emocionais uma enorme lista de distúrbios ou sintomas físicos dos mais variados, desde a úlcera péptica, certas paralisias, cegueiras, colites, eczemas, enxaquecas, etc., até tumores malignos, como o câncer. E para toda essa lista de doenças prescrevem-se, hoje em dia, os métodos psicoterápicos, como formas de agir na mente e obrigá-la a um melhor e mais sabido comportamento, capaz de eliminar esses sintomas, e se possível, melhor ainda, acabar com as próprias causas. Tais métodos psicoterápicos podem ir desde as formas mais rijas ou mais benignas da psicanálise, até os métodos mais rápidos, mais fáceis e mais eficientes, muitas vezes, da hipnoterapia, etc.

6) A Psicoterapia ocupacional, Ergoterapia, Laborterapia, Terapêutica da Atividade ou da Pessoa, Psicoterapia Educacional ou da Reeducação, etc., eis outros tantos nomes aplicados a uma espécie de psicoterapia de "meio termo'" ou de "senso comum", padronizada por eminentes médicos psiquiatras e psicoterapeutas dos últimos tempos, cujo exemplo poderia ser o Dr. Adolf Meyer, diretor durante mais de trinta anos da Clínica Psiquiátrica do Hospital Hopkins de Baltimore (USA).

De princípio, diz ele, "Não podemos considerar o homem senão como uma unidade, um Corpo-Espírito, e jamais como um corpo casualmente complicado por um espírito, ou um espírito, que parece estar sendo embaraçado por um corpo. Não podemos dividir a natureza. Nossos corpos têm almas e nossas almas têm corpos. Nenhuma via de acesso, portanto, deve ser fechada ao psicoterapeuta para que possa chegar ao doente, ou melhor ainda: nenhum psicoterapeuta deve estar condicionado a penetrar no doente por uma única porta, ou um único método. Cada ciência relacionada com ele pode contribuir com algo: a química, a anatomia, a fisiologia, a patologia, a psicologia, a sociologia, a hipnologia, etc. A psicanálise pode ser de um valor inestimável, desde que seja uma psicanálise de “bom senso” e tosquiada de seus elementos mais fantásticos. O inconsciente freudiano existe, mas certamente não precisamos preocupar-nos demasiado com ele. No tratamento do alienado podemos permanecer, perfeitamente, na região mais próxima e acessível à consciência e sua vida mais notória. O objeto total que mais nos deve interessar dele é a sua personalidade. Toda doença psíquica deve ser considerada como "um desajustamento global de toda uma personalidade", antes de considerá-la como um mero episódio ou como uma simples doença mental no sentido puramente fisiológico ou psicológico. O que nos resta a fazer é ajudar este pobre ser humano a reconstruir uma personalidade que se desfez ou que nunca conseguiu formar na sua vida".

Eis a base de sua terapêutica, que ele qualifica de "Psicobiologia". Devemos organizar um mapa ou quadro, o mais concreto e objetivo possível, que inclua toda a vida do doente, com o que é normal, menos normal e positivamente anormal e pernicioso.

Primeiro: sua vida antes de adoecer, seu caráter, seus problemas, e suas reações emocionais, seus fatores físicos e orgânicos, tais como doenças e hábitos da infância.

Segundo: todos os seus fatores emocionais, como repressões, recalques, instintos sexuais e frustrações.

Terceiro: suas relações com os outros, seus hábitos de trabalho, de dormir, de comer, etc., principais acontecimentos de sua vida, a mutação de seus hábitos e atitudes para com a sociedade.

A seguir, sobre o quadro de suas tendências e interesses, organizar um quadro de trabalho e de atividade capaz de lhe absorver, construtivamente, toda sua atividade mental (tecelagem, escultura, pintura, carpintaria, jardinagem, etc.). Assim fazendo, será obrigado a levar uma vida razoavelmente normal, despertando nele aqueles instintos e emoções adormecidos, que lhe devolverão a vida que perdeu.

Tudo isto nos parece muito mais normal do que uma convulsão (insulina-metrazol, choque elétrico); muito mais normal do que a psicanálise, sempre dando ênfase ao anormal. Trabalhar é uma coisa natural e normal para o homem, que não precisa muita explicação e compreensão de processos tão difíceis, como os tratamentos psicanalíticos ou tão desagradáveis como os psiquiátricos. é muito melhor levar as mentes anormais a aceitarem uma maneira normal da vida, do que focalizar constantemente sua atenção em alguma perversão, ou defeito, ou anormalidade, coisa que não lhes pode fazer muito bem. é melhor pôr a ênfase na saúde do que na doença. Procurando levar os pacientes a fazer algo que possam fazer, dar-lhes-emos descanso das coisas que os perturbam e não lhes fazem bem. Deste modo, poderemos reeducar esses espíritos doentios para o que lhes seja sadio. Tudo isto e sempre sob os cuidados e a orientação de um psicoterapeuta, que tratará de completar esse programa com todos os recursos da psicoterapia.

7) A Psicoterapia da Responsabilidade: é proposta por outro dos corifeus destas terapias do "meio termo"', aplicadas aos doentes mentais e psico-emocionais, o Dr. Abraham Nuerson, que chegou a esta conclusão depois de ter sido, durante muitos anos, defensor excepcional da escola fisiológica e dos métodos psiquiátricos, e o maior crítico "das salgalhadas da psicanálise e da inutilidade da psicoterapia". Mas, tendo atacado primeiramente a psicoterapia analítica como um "puro desperdício da atividade médica", teve que confessar, finalmente, a quase inutilidade dos tratamentos fisiológico-psiquiátricos.

Considerando a vida do neurótico e psicótico como uma "fuga da realidade exterior objetiva" e uma "retirada para a realidade subjetiva do mundo interior vêem-se estes doentes como submergidos num "vácuo insípido (dolce far niente), levando uma existência sem nenhuma motivação, sem obrigações e sem responsabilidades... ". Eles são mantidos nas instituições hospitalares, ou nos consultórios, ou no seio da família, sem nunca ser elogiados ou censurados; nunca recompensados e nunca punidos; nunca se lhes pede que tentem fazer alguma coisa, quer sejam bem sucedidos ou quer fracassem; sempre a esperar do dia em que "eles sozinhos mudem tudo isso..."

Deste ponto de partida, o Dr. Myerson formulou seu próprio método terapêutico, que qualificou de Psicoterapia da Responsabilidade ou do "Empurrão total". Para começar, escolheu trinta e três doentes de longa data, velhos moradores das enfermarias dos fundos em vários hospitais, considerados incuráveis, e passou a cercá-los de todos os lados e a estimulá-los, a fim de obrigá-los e iniciar a estrada que os conduziria de volta à normalidade. Estimulá-los, digo, totalmente: fisiológica e psicologicamente.

Primeiro o corpo. Aplicou-lhes a hidroterapia, sob todas as formas, desde o esguicho da mangueira, até os banhos prolongados; aplicou-lhes a fisioterapia, sob todos os modos: massagens, fricções, sol, eletricidade, eletrosono, etc. Deu-lhes esportes variados, grandes passeios, exercícios físicos e trabalhos diversos, até violentos algumas vezes. Purificou-lhes os corpos com dietas e purgantes, fortalecendo-os, a seguir, com ricas dietas em vitaminas. E isto foi uma parte do "empurrão total": o empurrão fisiológico.

Logo veio o empurrão psicológico. Todos foram levados a assumir certas "obrigações sociais" mínimas e fundamentais, novamente. Tirados de seus quartos onde antes ficavam à vontade, sem fazer nada, foram obrigados a comer, viver, e dormir em comum, sob regras estritas de "estética, de higiene, de companheirismo e de sociabilidade", como simples colegiais. Foram obrigados a trabalhar, a divertir-se e a associar-se com os outros, devendo vestir-se bem, de forma a serem agradáveis a si e aos outros. Começou também um regime sistemático de elogios e censuras, recompensas e penalidades, sempre na presença dos demais doentes. Bombons, sorvetes, cigarros, etc., dados por bom ou retirados por mau comportamento.

O Dr. Myerson reconheceu que este seu método da responsabilidade ou do "empurrão total" não é um método totalmente original nem constitui um método de "cura" propriamente dito, mas sim um método de "melhora", como a maioria dos outros, aliás. E constitui outro tratamento de "meio termo" que significa um acordo entre os métodos psiquiátricos e psicológicos, para o tratamento das doenças mentais e psico-emocionais, oferecendo ótimos resultados, por vezes até nos casos mais sem esperança.

8) A psicoterapia do Equilíbrio. O terceiro método da psicoterapia do '"meio termo" é o do Dr. Overhosler, primeiramente um legítimo representante da linha psicanalista e inimigo acérrimo dos choques elétricos e insulínicos ou dos demais tratamentos fisiológicos radicais, como o metrazol, congelamento, estrogênio, etc., mas finalmente um dissidente da psicoterapia analítica.

Reconhece, sim, que a Psicanálise é inestimável como psicologia analítica para a compreensão da mente anormal e os comportamentos patológicos, mas considera-a como de nenhum valor como tratamento psicoterápico, principalmente para o caso das psicoses. "Acredito no inconsciente — diz ele — e na possibilidade de influenciar o espírito doente pela psicanálise, muito mais que pelos recursos fisiológicos radicais, como os choques. Mas, não estando diante de um corpo ou de um espírito, mas sim diante de um organismo vivo e composto de corpo e espírito, que reagem de diversas maneiras; e não podendo menosprezar os fatores mentais das doenças físicas nem os efeitos destas sobre os nossos pensamentos e sentimentos, resta-nos utilizar todas as classes de terapias que nos possam ajudar a curar ou melhorar a personalidade desorganizada ou desequilibrada".

Na realidade, é um erro chamar de doenças mentais a todos os distúrbios psíquicos e perturbações temperamentais, como usualmente se faz, mesmo que em quase todos eles ocorra uma diminuição das faculdades pensantes. Não são somente os iletrados os que sofrem colapsos mentais ou comportamentais. São homens e mulheres de todas as classes sociais, incluindo muitas pessoas de cultura elevada e figuras importantes do mundo intelectual: juízes, banqueiros, industriais, artistas, professores, padres, etc. Porcentualmente, vê-se que o número de pessoas cultas com problemas psíquico-mentais é superior ao de pessoas iletradas. E estas pessoas cultas, quando adoecem mentalmente, nem sempre perdem algo de sua cultura ou de sua inteligência, que muitas vezes fica mais aguda que antes.

9) O que se observa, certamente, é que toda pessoa mentalmente doente, quer nas fases iniciais de um colapso nervoso, quer nas fases finais de uma psicose, deixa de levar uma "vida equilibrada"', e muitas pessoas normais começam a caminhar paulatinamente ao encontro da doença, porque elas também começam a levar uma vida desequilibrada ou desregrada. "Desequilibrado" é mesmo uma das expressões para designar uma pessoa, mental ou psiquicamente doente. Desequilibrado intelectualmente? Algumas vezes só. Emocionalmente quase sempre, a não ser quando a doença é claramente de origem cerebral. Normalmente percebe-se que não é a razão que foi destruída, mas a emoção que tomou o seu lugar. Não deveríamos referir-nos a este estado de espírito pelo nome de "demência" ou de doença mental, mas sim pelo de desequilíbrio emocional, ou simplesmente de DESEQUILíBRIO, como termo básico a ser adotado, em vez do já gasto e inexpressivo de neurose ou de psicose.

Desequilíbrio mental, quando a mente ou cérebro é diretamente atingido, ou por moléstia orgânica, ou funcionalmente, por perturbações psíquicas e emocionais;

Desequilíbrio psicológico, em muitos comportamentos esquisitos do caráter ou da personalidade;

Desequilíbrio emocional, a maioria das vezes, quando as emoções infelizes e destrutivas de medo, ansiedade, indecisão, tensão, aborrecimento, ciúmes, sentimentos de culpa, hipersensibilidade, sentimento de inferioridade, insegurança, etc., obtiver a hegemonia da razão, desplaçando mais ou menos totalmente as emoções felizes, construtivas e sadias de amor, felicidade, coragem, autoconfiança, otimismo, ambição, etc.

A não ser no primeiro caso, a técnica terapêutica então a ser escolhida deveria ser a do reequilíbrio da personalidade desequilibrada; isto é, a procura do "equilíbrio" por todos os métodos e modos, e em todos os níveis:

Equilíbrio energético, físico e psíquico;

Equilíbrio mental, somático e funcional, removendo as causas somáticas ou emocionais;

Equilíbrio psíquico; e

Equilíbrio emocional, principalmente.

E o melhor método terapêutico a ser escolhido deverá ser aquele que ofereça melhores garantias de restabelecer o desejado equilíbrio e no nível desejado.

O desequilíbrio emocional, o principal de todos, talvez, com todas as suas seqüelas psíquicas, mentais e fisiológicas, não existiria dentro de uma vida de atividades equilibradas e não frustrativas. Muita gente leva uma vida unilateral; só negócios, só exercícios físicos em excesso, só prazeres sexuais, ou só diversões. O homem é um animal plurilateral, e quando só um lado de sua natureza é satisfeito, todos os demais ficam frustrados, resultando ele mesmo mutilado e vazio.

10) Por exemplo: há quatro coisas ou atividades na vida sem as quais um homem ou uma mulher não se sente satisfeito e completo: trabalho, distrações ou divertimentos, vida social e exercícios físicos. Uma vida equilibrada, portanto, que pretenda evitar chegar ao desequilíbrio deve levar em conta essas quatro coisas. E da mesma maneira uma terapia que queira restabelecer o equilíbrio numa vida emocional ou psiquicamente, deve ser uma terapia reeducacional, que de algum modo ofereça a satisfação proporcionada por essas quatro coisas, ou por aquela, por cuja falta se tenha desequilibrado.

Um trabalho, atividade ou ocupação, acessível e útil, não só a si, mas também aos outros, capaz de preencher o vazio exigido por sua natural dedicação;

Uma atividade social, que lhe satisfaça a afetividade, companhia e mesmo a vaidade de que necessita;

Exercícios físicos ou esportes, que dêem vazão ao excesso de energias, por ventura não gastas em outras atividades, e também à natural agressividade, gerada pelos constantes conflitos da vida cotidiana;

Um passatempo ou diversão, que substitua a natural satisfação, outrora proporcionada pelos brinquedos a que ficou condicionada na infância;

E, naturalmente, uma vida sexual e afetiva, regradas, que não pode faltar, normalmente, na vida das pessoas sadias.

Só assim o sadio não ficará doente, e o doente poderá restabelecer sua saúde. A psicoterapia educacional ou reeducacional, aliada à psicoterapia ocupacional e demais recursos e tratamentos fisiológicos e psicológicos, serão capazes de conservar nossa humanidade livre do flagelo das doenças psíquico-emocionais e mesmo das mentais.