E eles eram dois mansos passarinhos


Queriam-se na paz indefinida
      Das almas que são puras,
Cheios de amor, de luz e de carinhos,
Eles passavam docemente a vida,
      Isentos de amarguras.
Então sorriam, sem pensar que a morte
Inda podia lhes mudar a sorte.
      E sempre eles cantavam
      Se no espaço adejavam!

      Ao despontar da aurora
Chalravam, procurando, estrada a fora,
      O alimento do dia.
      Saltando de alegria
Assim voltavam conversando a medo
E pousavam, alegremente, rindo,
      Nos ramos do arvoredo.

Eu quisera saber o seu segredo:
      Devia ser tão lindo!
Depois, ruflando as asas amarelas,
Iam embora... E eu, triste e sozinha,
      Olhava para as belas
Ramagens, onde eles mansamente
      Pousavam à tardinha.

A viração, gemendo docemente,
Vinha beijar as avezinhas puras.

Terminaram, porém, tantas venturas:
      Morreu um passarinho
      Ficou deserto o ninho!

O outro partiu... Não sei onde foi ter;
Talvez bem longe, para, então, morrer,
      Em triste soledade.
      E o meu olhar dorido
Seguiu a ave, pelo pavor ferido.
      Ficava uma saudade!

E murmurei comigo entristecida:
      Ó asa aventureira!
Levas toda a paixão de minha vida,
      Levas minh’alma inteira!

Desde então vivo triste. Às vezes penso
Neste sofrer indefinido, imenso
          D’um pobre coração
Que nas asas do tempo vê voar,
          A chorar,
          A última ilusão...

1893.