Quero tambem ser poeta,
Bem pouco, ou nada me importo
Se a minha veia é discreta,
Se a via que sigo é torta.

(F. X. de Novaes.)


Alta noute, sentindo o meu bestunto
Pejado, qual vulcão de flamma ardente,
Leve pluma empunhei, incontinente
O fio das idéas fui traçando.

As Nymphas invoquei para que vissem
Do meu estro voraz o ardimento;
E depois revoando ao firmamento,
Fossem do Vate o nome apregoando.

Oh Musa de Guiné, côr de azeviche,
Estatua de granito denegrido,
Ante quem o Leão se poem rendido,
Despido do furor de atroz braveza;
Empresta-me o cabaço d’urucungo,
Ensina-me a brandir tua marimba,
Inspira-me a sciencia da candimba,
A’s vias me conduz d’alta grandeza.

Quero a gloria abater de antigos vates,
Do tempo dos heroes armipotentes;
Os Homeros, Camões — aurifulgentes,
Decantando os Barões da minha Patria!
Quero gravar em lucidas columnas
Obscuro poder da parvoice,
E a fama levar da vil sandice
A’ s longínquas regiões da velha Bactria!

Quero que o mundo me encarando veja,
Um retumbante Orpheo de carapinha,
Que a Lyra despresando, por mesquinha,
Ao som decanta de Marimba augusta;
E, qual outro Arion entre os Delfins,
Os a vidos piratas embaindo —
As ferrenhas palhetas vai brandindo
Com estylo que presa a Lybia adusta.

Com sabença profusa irei cantando
Altos feitos da gente luminosa,
Que a trapaça movendo portentosa
A’ mente assombra, e pasma á natureza!
Espertos eleitores de encommenda,
Deputados, Ministros, Senadores,
Galfarros Diplomatas — chuchadores,
De quem resa a cartilha da espertesa.

Caducas Tartarugas — desfructaveis,
Velharrões tabaquentos — sem juiso,
Irrisorios fidalgos — de improviso,
Finorios traficantes — patriotas;

Espertos maganões de mão ligeira,
Emproados juizes de trapaça,
E outros que de honrados teem fumaça,
Mas que são refinados agiotas.

Nem eu proprio á festança escaparei;
Com foros de Africano fidalgote,
Montado n’um Barão com ar de zóte —
Ao rufo do tambor e dos zabumbas
Ao som de mil applausos retumbantes,
Entre os netos da Ginga, meus parentes,
Pulando de prazer e de contentes —
Nas danças entrarei d’altas cayumbas.