Lucrécias/XV - Adeus às Raparigas


Sabeis, raparigas! a mãe de Felícia,
Felícia a risonha, gentil costureira
Com quem pela Páscoa, sem ser por malícia,
Gastei muitas notas de minha carteira;
 
Felícia a dos olhos mais negros que hei visto,
De faces coradas, cintura maneira,
E uns lábios de favos... de favos, é isto!
Beijei-os um dia, mas por brincadeira;
 
Felícia que há meses, comigo jogando,
Da mãe às ocultas, sentada na esteira,
Em vendo que a vela se’stava apagando
Desmaia nos meus braços... de certa maneira...
 
Felícia, a acoitada! que teve a desgraça
De ser descendente de velha parteira,
Que dizem (mas isto não chegue à praça),
Compor elixires de moça solteira...
 
Sabeis, raparigas! a tal criatura
Quer hoje que a filha professe de freira!
Porque? vêem a birra? da filha a cintura
Não vê que como outr’ora delgada e maneira?!
 
E nisto a pé firme jurando bentinhos,
Não cede a pedidos nem a choradeira!
E o mais? não vos conto!... não disse aos vizinhos
Que eu era o culpado da filha ir ser freira?
 
Que tem a cintura comigo,
Dizei, raparigas, não é forte asneira?
Mas isto é já sério, tão sério, tão sério, vos digo,
Que tiro a desforra de tal maroteira!
 
Adeus, raparigas, estou decidido...
Não sou mais quem era, mudei de carreira;
Pois façam de conta que tenho morrido,
Que eu vou-me ser frade no claustro da freira.