Pobre mulher, aquela boa e sincera mãe que vi ontem, tão mansa, tão entregue ao seu pequenino!
Era bonita, mas como que o ignorava. Estava tão despreocupada no bonde como se estivesse em sua casa. 'Trazia o filhinho ao regaço, e brincava-lhe com uma das mãozinhas, fazendo-a saltar, arremessando-a e abaixando-a, aos pequenos tapas, como uma bola. O pequeno ria-se de quando em quando, e a cada risada o rosto da mãe tomava uma expressão forte, escultural de felicidade plena e remansosa.
A certo momento, pegou a criança pelo tronco, pô-la em pé sobre os joelhos, e começou a sacudi-la como a pregar-lhes sustos. Fazia-lhe, ora, uma cara de surpresa cômica, arregalando os olhos; ora, uma cara de cólera, carregando as sobrancelhas, afuzilando o olhar; ora, uma cara de choro desconsolado, em que todos os músculos se relaxavam e as pálpebras e os cantos da boca descaíam.
Jogral do seu pequerrucho, essa mãe se esquecia de si, se despojava de todas as preocupações habituais, concentrava toda a sua vida naquele ser único, pequenino e fragílimo. Era um simples brinquedo em poder do seu bebê, - brinquedo todo cheinho de amor, como outros o são de serragem.
Mas, por que, deuses imortais e impossíveis! por que seria necessário que essa mãe, resumindo o mundo em seu filho, trabalhasse tão obstinadamente por gravar nele os gestos eternos da loucura humana? Gestos de fúria, de terror, de cupidez, de despeito, de ciúme, - toda a mímica do inferno mundano, - formas para ele ainda vazias, mas nas quais se irá pouco a pouco vertendo e solidificando a substância do seu pequeno Eu rarefeito e disperso?
Ama-o como a um anjo, e luta por fazer dele apenas um destes vasos de miséria, de impureza e de sofrimento!
Belo e medonho, o amor de mãe. Suavíssimo e terrível. A sombra dos seus gestos, branda como a dos ramos, prolonga-se até o horizonte da vida, onde a sombra enorme da Fatalidade passa arrastando pelos cabelos a sombra da Ilusão.