EPÍLOGO
 

Acabou-se a história e morreu a vitória.

Não havia mais ninguem lá. Dera tangolomangolo na tribu Tapanhumas e os filhos dela se acabaram de um em um. Não havia mais ninguem lá. Aqueles lugares aqueles campos furos platós aqueles matos misteriosos, tudo era a solidão do deserto. Um silêncio imenso dormia a beira-rio do Uraricoera.

Nenhum conhecido sobre a Terra não sabia nem falar na fala da tribu nem contar aqueles casos tão pansudos. Quem que podia saber do heroi? Agora os manos virados na sombra leprosa eram a segunda cabeça do Pai do Urubú e Macunaíma era a constelação da Ursa Maior. Ninguem jamais não podia saber tanta história bonita e a fala da tribu acabada. Um silêncio imenso dormia a beira-rio do Uraricoera.

Uma feita um homem foi lá. Era madrugadinha e Vei mandara as filhas visar o passe das estrêlas. O deserto tamanho matava os peixes e os passarinhos de pavor e a propria natureza desmaiara e caíra num gesto largado por aí. A mudez era tão imensa que espichava o tamanhão dos paus no espaço. De repente no peito doendo do homem caiu uma voz da ramaria:

— Currr-pac, papac! currr-pac, papac!…

O homem ficou frio de susto feito piá. Então veio brisando um guanumbí e boleboliu no beiço do homem:

— Bilo, bilo, bilo, lá… tetea!

E subiu apressado prás árvores. O homem seguindo o vôo do guanumbi, olhou pra cima.

— Puxa rama, boi! o beijaflor se riu. E escafedeu.

Então o homem descobriu na ramaria um papagaio verde de bico doirado espiando pra êle. Falou:

— Dá o pé, papagaio.

O papagaio veio pousar na cabeça do homem e os dois se acompanheiraram. Então o passaro principiou falando numa fala mansa, muito nova, muito! que era canto e que era cachirí com mel-de-pau, que era boa e possuia a traição das frutas desconhecidas do mato.

A tribu se acabara, a familia virara sombras, a maloca ruira minada pelas saúvas e Macunaíma subira pro céu, porém ficara o aruaí do sequito daqueles tempos de dantes em que o heroi fôra o grande Macunaíma imperador. E só o papagaio no silêncio do Uraricoera preservava do esquecimento os casos e a fala desaparecida. Só o papagaio conservava no silêncio as frases e feitos do heroi.

Tudo êle contou pro homem e depois abriu asa rumo de Lisboa. E o homem sou eu, minha gente, e eu fiquei pra vos contar a história. Por isso que vim aqui. Me acocorei em riba destas folhas, catei meus carrapatos, ponteei na violinha e em toque rasgado botei a boca no mundo cantando na fala impura as frases e os casos de Macunaíma, heroi de nossa gente.

Tem mais não.