Algumas pessoas de patriotismo fogoso, sabendo ou conjeturando com bons fundamentos, que a Câmara Municipal da Cidade do Recife se dispunha a jurar e fazer jurar o Projeto de Constituição, que o Imperador impunha, reuniram-se na Casa da mesma Câmara; e esta ausente, a declaram deposta, e elegeram outra; tudo isto, se ilegalmente feito, o fizeram todavia sem o menor barulho, e em serena tranqüilidade. Dissemos se ilegalmente feita; mas no estado que desorganização social, em que nos achávamos, pela dissolução da Assembléia Constituinte, suposto o diverso modo de confeccionar-se a Constituição Política do Brasil, modo novo e avesso do que tínhamos proclamado e jurado, e conosco o Imperador, novidade e mudança a que não aderíamos; que havia aí de rigorosamente ilegal, naquelas deposição e eleição? Em tão extraordinárias circunstâncias toda a aplicação e cuidado, todo o zelo e afago dos espíritos exaltados e atônitos dirigiam-se a procurar e manter o bem e dignidade nacional, a vigiar e defender a nossa honra, inteligência e direitos, à salvação da pátria, podemos dizê-lo. Havia boa-fé, e a melhor intenção. Nem se pode fugir de reconhecer, que posto a salvação da Pátria seja as mais das vezes um pretexto para o despotismo ou a anarquia, não deixa algumas vezes o emprego dessa suprema lei de ser um verdadeiro e saudável recurso para a boa conservação e liberdade social.

Mas a quem se deve imputar, em última análise, tais ilegalidades, se de qualificarmos assim aquelas deposição e eleição não cabe desdizer-nos?

A nova câmara por editais, que repetidos fêz afixar, e por inumeráveis cartas, que dirigiu a todas as autoridades, empregados públicos de todas as classes, proprietários e pessoas notáveis do seu distrito, convidou-os a comparecer no dia, que marcou, na casa da mesma câmara, para ai livremente darem o seu voto sobre a execução do decreto, que mandava jurar o projeto de constituição política, que oferecera o imperador; pois que este magno assunto pertencia a todos resolver, e não a ela só, e menos impor com o seu voto e conduta aos cidadãos do seu município. Muitos dos convidados por cartas deixaram de comparecer no dia aprazado, e pelos que compareceram foi o negócio discutido, e afinal venceu-se, que se não devia receber nem jurar o projeto; primeiro por ser iliberal, contrário à liberdade, independência e direitos do Brasil, e apresentado por quem não tem poder para o dar; e segundo por envolver o seu juramento perjúrio ao juramento cívico, em que se prometeu reconhecer e obedecer à assembléia constituinte e legislativa. Frei Joaquim do Amor Divino Caneca leu o seu voto, e este impresso correu pelas mãos de todos; ei-lo aqui: "Senhor presidente, tendo eu recebido a honra de ser convidado por V. Ex.ª para, como membro do corpo literário desta cidade, dar o meu voto sobre a matéria do decreto de S.M.I. e C. de 11 de março deste presente ano, pelo qual o dito senhor manda jurar, como constituição do império do Brasil, o projeto feito pelo ministério e conselho de estado, apareci neste lugar, não só para provar a V. Ex.ª quanto prezei o seu convite, mas também para fazer ver aos meus honrados compatriotas, que me não poupo a cooperar com eles para o bem e felicidade da Pátria, quanto permitem minha fraqueza e meu estado; e não tenho, nem passar por oráculo em uma assembléia que compreende tantas pessoas acima de mim em princípios luminosos e sentimentos liberais. Portanto, me abalanço a manifestar as minhas curtas e mesquinhas idéias na esperança de que dos sábios merecerei correção, e dos que não se acham nesta linha, desculpa e docilidade; digo pois; que não se deve adotar, nem jurar como constituição do império o projeto oferecido para este fim.

A certeza, em que estou, de falar entre cidadãos livres, patriotas e coroáveis da verdade, é o sustentáculo da liberdade e fraqueza, com que avanço esta proposição, que por mais escabrosa que pareça aos ânimos prejudicados, e idólatras fanáticos de antigos prejuízos, se fará aceitável, se me não engano, pelas razões, que desenvolverei; e é a quanto aspiro.

Parecia-me, que seria útil, para melhor estabelecer o meu voto, fazer aqui uma ligeira exposição das vicissitudes e mudanças políticas, por que há passado a nossa Pátria, o Brasil, desde que S. M. I. se dignou ficar conosco até agora; mas respeitáveis senhores, lembrando-me que talvez a julgásseis supérflua, por estardes ao fato de tudo, a deixei de mão e passo logo a tratar da matéria. Falarei primeiramente da qualidade do presente projeto, quanto posso alcançar, para ao depois examinar, se se deve ou não adotar.

Uma constituição não é outra coisa, que a ata do pacto social, que fazem entre si os homens, quando se ajuntam e associam para viver em reunião ou sociedade. Esta ata, portanto, deve conter a matéria, sobre que se pactuou, apresentando as relações, em que ficam os que governam, e os governados, pois que sem governo não pode existir sociedade. Estas relações, a que se dão os nomes de direitos e deveres, devem ser tais, que defendam e sustentem a vida dos cidadãos, a sua liberdade, a sua propriedade, e dirijam todos os negócios sociais à conservação, bem-estar e vida cômoda dos sócios, segundo as circunstâncias de seu caráter, seus costumes, usos e qualidade do seu território etc. Projeto de constituição é o rascunho desta ata, que ainda se há de tirar a limpo, ou apontamentos das matérias que hão de ser ventiladas no pacto; ou, usando de uma metáfora, é o esboço na pintura, isto é, a primeira delineação, nem perfilada, nem acabada. Portanto, o projeto oferecido por S. M. nada mais é do que o apontamento das matérias, sobre que S. M. vai a contratar conosco. Vejamos, portanto, se a matéria ai lembrada, suas divisões e as relações destas são compatíveis com as nossas circunstâncias de independência, liberdade, integridade do nosso território, melhoramento moral e físico, e segura felicidade.

Sendo a nossa primeira e principal questão, em que temos empenhado nossos esforços, brio e honra, a emancipação e independência de Portugal, esta não se acha garantida no projeto com aquela determinação e dignidade necessária; porque primeiro no projeto não se determina positiva e exclusivamente o território do império, como é de razão, e o tem feito sabiamente as constituições mais bem formadas da Europa e América; e com isto se deixa uma fisga, para se aspirar à união com Portugal; o que não só trabalham por conseguir os déspotas da santa aliança e o rei de Portugal, como o manifestam os periódicos mais apreciáveis da mesma Europa e as negociações do ministério português com o do Rio de Janeiro e correspondência daquele rei com o nosso imperador, com o que S. M. tem dado fortes indícios de estar deste acordo, não só pela dissolução arbitrária e despótica da soberana assembléia constituinte, e proibição da outra que nos havia prometido, mas também, além de outras muitas coisas, porque se retirou da capital do Império para não solenizar o dia 3 de maio, aniversário da instalação da assembléia, que por decreto era dia de grande gala; e no dia 13, dia dos anos do rei de Portugal, S. M. deu beija-mão no paço e foi à Ilha das Enxadas, onde se achavam as tropas de Portugal, vindas de Montevidéu, estando arvorada com o maior escândalo a bandeira portuguesa; segundo porquanto ainda que no primeiro artigo se diga, que a Nação brasileira não admite com outra qualquer laço algum de união ou federação, que se oponha a sua independência, contudo esta expressão é para iludir-nos; pois que o executivo, pela sua oitava atribuição (art. 102) pode ceder ou trocar o território do império ou de possessões, a que o império tenha direito, e isto independentemente da assembléia geral; terceiro porque jurando o Imperador a integridade e indivisibilidade do império, não jura a sua independência.

Ao depois é este Juramento contraditório com esta oitava atribuição, porque se S. M. jura a indivisibilidade do Império, como pode ceder ou trocar o seu território? Só se isto se deve entender de ceder o território do Império todo por inteiro e passar-nos então a todos, com suas famílias e haveres, ou para os desertos da Tartaria, ou para os da África, ou afinal lá para os Botocudos, entregando as nossas cidades e vilas ao que com ele contratar.

O art. 2.º não pode ser mais prejudicial à liberdade política do Brasil; porque permitindo que as províncias atuais sofram novas subdivisões, as reduz a um império da China, como já se lembrou e conheceu igual maquiavelismo no projeto dos Andradas o Deputado Barata; enfraquece as províncias, introduzindo rivalidades, aumentando os interesses dos ambiciosos para melhor poder subjugá-las umas por outras; e esta desunião tanto mais se manifesta pelo art. 83, em que se proíbe aos conselhos provinciais de poderem propor e deliberar sobre projetos de quaisquer ajustes de umas para as outras províncias, o que nada menos é, que estabelecer a desligação das províncias entre si, e fazê-las todas dependentes do governo executivo, e reduzir a mesma nação a diversas bordas de povos desligados e indiferentes entre si, para melhor poder em última análise estabelecer-se o despotismo asiático.

O poder moderador de nova invenção maquiavélica é a chave mestra da opressão da nação brasileira e o garrote mais forte da liberdade dos povos. Por ele o imperador pode dissolver a câmara dos deputados, que é a representante do povo, ficando sempre no gozo dos seus direitos o senado, que é a representante dos apaniguados do imperador. Esta monstruosa desigualdade das duas câmaras, além de se opor de frente ao sistema constitucional, que se deve chegar o mais possível à igualdade civil, dá ao imperador, que já tem de sua parte o senado, o poder de mudar a seu bel prazer os deputados, que ele entender, que se opõem a seus interesses pessoais, e fazer escolher outros de sua facção, ficando o povo indefeso nos atentados do imperador contra seus direitos, e realmente, escravos, debaixo porém das formas da lei, que é o cúmulo da desgraça como tudo agora está sucedendo na França, cujo rei em dezembro passado dissolveu a câmara dos deputados, e mandando-se eleger outros, foram ordens do ministério para os departamentos a fim de que os prefeitos fizessem eleger tais e tais pessoas para deputados, declarando-se-lhes logo, que quando o governo empregava a qualquer, era na esperança de que este marchará por onde lhe mostrassem a estrada. Demais, eu não posso conceber como é possível, que a câmara dos deputados possa dar motivos para ser dissolvida, sem jamais poder dá-los a dos senadores. A qualidade de ser a dos deputados temporária, e vitalícia a dos senadores, não só é uma desigualdade, que se refunde toda em aumentar os interesses do imperador, como é o meio de criar no Brasil, que felizmente não a tem, a classe da nobreza opressora dos povos; a qual só se tem atendido naqueles povos, que foram constituídos depois de já terem entre si seus duques, seus condes, seus marqueses etc. E este é o mesmo fim da atribuição undécima do poder executivo, que na minha opinião é o braço esquerdo do despotismo, sendo o direito o ministério organizado da maneira que se vê no projeto.

Podem os ministros de estado propor leis, (art. 53) assistir a sua discussão, votar sendo senadores e deputados (art. 54). Qual será a coisa, portanto, que deixarão eles de conseguir na assembléia geral? Podem ser senadores e deputados, (art. 30) exercitando ambos os empregos de senadores e ministros; e o mesmo se diz dos conselheiros, (art. 32) ao mesmo tempo que o deputado, sendo escolhido para ministro, não pode conservar um outro emprego; isto além de ser um estatuto sem o equilíbrio, que deve de haver entre os mandados e o mandante, é um absurdo em política, que aqueles que fazem ou influem na fatura das leis sejam os mesmos que as executem; e não se pode apresentar uma prova mais autêntica da falta de liberdade do projeto, do que esta. É por este motivo, que diz o sábio cardeal Maury, que: "Todo o cidadão que sabe calcular as conseqüências dos princípios políticos, deve abjurar uma pátria em que aqueles que fazem as leis, são magistrados, e onde os representantes do povo que têm fixado a legislação, pretendem influir na administração da justiça."

A suspensão da sanção imperial a qualquer lei formada pela assembléia geral por duas legislaturas (art. 65) é inteiramente ruinosa à felicidade da nação, que pode muito bem depender de uma lei, que não deva admitir uma dilação pelo menos de oito anos, muito principalmente quando vemos, que para a lei como sancionada, pela dilação do tempo, é indispensavelmente necessário que as duas legislaturas seguintes insistam a eito sobre a mesma lei (art. 65).

A oitava atribuição do poder executivo, que é de fazer tratados de aliança defensiva e ofensiva, levando-os depois de concluídos ao conhecimento da assembléia geral, é de muito perigo para a nação, pois que ela não interfere com o seu conhecimento e consentimento em negócio que tanta importância, muito principalmente quando se vê, que o mesmo executivo julga necessária a aprovação prévia da assembléia geral para execução dos breves, letras pontifícias, decretos e concílios, quando envolverem disposição geral (art. 14).

A atribuição privativa do executivo de empregar, como bem lhe parecer conveniente à segurança e defesa do império, a força armada de mar e terra (art. 148), é a coroa do despotismo e a fonte caudal da opressão da nação, e o meio de que se valeram todos os déspotas para escravizar a Ásia e Europa, como nos conta a história antiga e moderna.


Pelos arts. 55, 56, 57, 58 e 59, a câmara doa deputados está quase escrava da dos senadores, e o remédio que se aplica, no caso de discórdia, me parece paliativo, obscuro e impraticável.

Os conselhos das províncias são uns meros fantasmas para iludir os povos; porque devendo levar suas decisões à assembléia geral e ao executivo conjuntamente, isto bem nenhum pode produzir às províncias; pois que o arranjo, atribuições e manejo da assembléia geral faz tudo em último resultado depender da vontade e arbítrio do Imperador que arteiramente avoca tudo a si, e de tudo dispõe a seu contento e pode oprimir a nação do modo mais prejudicial, debaixo da forma da lei. Depois, tira-se aos conselhos o poder de projetar sobre a execução das leis, atribuindo esta, que parece de suma necessidade ao conselho; pois que este mais que nenhum outro, deve de estar ao fato das circunstâncias do tempo, lugar, etc., da sua província, conhecimentos indispensáveis para a cômoda e frutuosa aplicação das leis.

Estas são as coisas maiores, que minha fraqueza pode descobrir no projeto em questão, e que eu julgo de sumo perigo para a independência do império, sua integridade, sustentação da liberdade dos povos e conservação sagrada da sua propriedade; e estas mesmas coisas as expus sumariamente, ou levemente tocadas, por não admitir a presente conferência discursos extensos. Talvez eu nestas mesmas me engane, e não tenha idéias exatas, nem saiba combiná-las e conceder-lhes a necessária relação, que há entre si, por cujo motivo me pareça mau, opressor e contraditório o projeto; mas no entanto é o que por ora entendo, e sendo chamado para dar o meu voto, hei de votar não pelas idéias que os outros têm, sim pelas minhas; portanto digo, que pelo que é em si esta peça de política, estes rascunhos de constituição não se deve admitir.

Agora direi o mesmo por outro princípio, a saber, pela fonte de que manou. É princípio conhecido pelas luzes do presente século, e até confessado por S. M., que a soberania, isto é, aquele poder, sobre o qual não há outro, reside na nação essencialmente; e deste princípio nasce como primária conseqüência, que a mesma nação é quem se constitui, isto é, quem escolhe a forma do governo, quem distribui esta suma autoridade nas partes, que bem lhe parece, e com as relações; que julga mais adequadas ao seu aumento, segurança da sua liberdade política e sua felicidade; logo é sem questão, que a mesma nação, ou pessoa de sua comissão, é quem deve esboçar a sua constituição, purificá-la das imperfeições e afinal constitui-la; portanto como S. M. I. não é nação, não tem soberania, nem comissão da nação brasileira para arranjar esboços de constituição e apresentá-los, não vem este projeto de fonte legítima, e por isso se deve rejeitar por exceção de incompetência. Muito principalmente quando vemos, que estava a representação nacional usando da sua soberania em constituir a nação, e S. M. pelo mais extraordinário despotismo e de uma maneira a mais hostil dissolveu a soberana assembléia e se arrogou o direito de projetar constituições.

Reflito, que só a ação de escolher por si a matéria do pacto social, e dá-lo, como faz S. M., é um ato da soberania, que ele não tem. Isto é uma conseqüência imediata da soberania da nação, como pode ocorrer a qualquer que pensar por alguns minutos neste negócio; mas se fossem precisos argumentos externos, além de outros muitos, que por abreviar eu calo, basta lembrar o autor das reflexões contra os redatores do investigador Português da Inglaterra, o qual prova forte e justamente, que as cortes de Lamego, e outras de Portugal nunca tiveram o poder legislativo, como as câmaras dos pares e comuns da Inglaterra, porque os reis de Portugal foram os que nas cortes propuseram a matéria das ordenações e das leis. Em segundo lugar, que em S. M. não há atribuição alguma, donde se possa deduzir o poder de nos dar constituição e mandá-la jurar, porquanto o título de imperador, com que o Brasil extemporaneamente o condecorou, não foi mais que uma declaração antecipada de que ele seria o chefe do poder executivo no sistema constitucional, que proclamamos, com um certo poder provisório, que se fazia indispensável para preparar a nação para o efeito de se constituir como mesmo S. M. confessou no dia 3 de maio da abertura da assembléia soberana, o qual poder provisório cessou com a abertura da assembléia, e as atribuições que ele teria, ainda haviam de ser declaradas pela mesma assembléia; é por isso que S. M a dissolveu: as suas atribuições são tudo aquilo, que lhe adquirem as suas armas, e lhe cederem a fraqueza e medo dos povos.

S. M. está tão persuadido, que a única atribuição, que tem sobre os povos, é esta do poder da força, a que chamam outros a última razão dos estados, que nos manda jurar o projeto com um bloqueio à vista, fazendo-nos todas as hostilidades; por cujo motivo não se deve adotar nem jurar semelhante esboço de constituição, pois o juramento para ligar em consciências, e produzir seu efeito, é indispensavelmente necessário ser dado em plena liberdade, e sem a menor coação; e ninguém jamais obrou livremente obrigado da fome, e com bocas de fogo aos peitos.

Ainda que, Ilustre senhores, para se estabelecer uma verdade, não se faca mister multidão de provas, contudo há ocasiões, em que ela deve ser encarada por todos os lados, muito principalmente quando é de tanta monta como esta, e pode produzir conseqüências funestíssimas; e além disto, correm impressos sedutores, que se esforçam em sustentar o erro, adornando-o com as galas emprestadas da verdade e da justiça. Portanto, ainda vos lembro, que este juramento vos conduziria a um horroroso perjúrio, que vos tornará detestáveis à face dos homens.

Vós, senhores, no dia 17 de outubro de 1822, na Igreja matriz do Sacramento, dissestes - Nós juramos perante Deus, seus sacerdotes e altares, adesão à causa geral do Brasil, e seu sistema atual, debaixo dos auspícios do Sr. Pedro, príncipe regente constitucional, e defensor perpétuo do Brasil, a quem obedecemos; e assim juramos reconhecer e obedecer as cortes brasilianas constituintes e legislativas, e defender a nossa pátria, liberdade e direitos ate vencer ou morrer."

Como agora podereis jurar uma carta constitucional que não foi dada pela soberania da nação, que vos degrada da sociedade de um povo livre e brioso para um valongo de escravos e curral de bestas de carga? Um projeto, que destrói a vossa categoria no meio das nações livres do orbe? Seria injusta a matéria do primeiro juramento para não vos ligar? Ou estareis agora loucos rematados? Ou haverá poder, que, dispensando-vos do primeiro juramento, possa de vós exigir o segundo? Onde está vossa moral, vossos costumes, vossa religião? Se tal desgraça sucedesse, como olhariam para nós os outros povos nossos conterrâneos e externos? Quem quererá contratar com um povo tão imoral e tão sem respeito aos laços mais sagrados da sociedade, e tão sem acatamento para a religião de que faz glória?

Tenho ouvido a algumas pessoas, que se pode jurar o projeto, à exceção daqueles artigos, que ofendam os nossos interesses. Isto ou é uma velhacaria, para por este jeito manhoso nos lançarem os ferros do cativeiro; ou uma Ignorância pueril, que merece compaixão. Porque havendo-se demonstrada, que este artefato político é um sistema de opressão; que os principais anéis desta cadeia, são inteiramente destruidores da nossa independência, da integridade do Brasil, liberdade política e civil, tem-se feito ver que o sistema é mau, opressor e ruinoso, e portanto inadmissível, bem que hajam alguns elos intermédios, que sejam bons, como se vêm alguns nas disposições gerais. Depois disto, esperar-se, que o imperador, que teve a valentia de dissolver a assembléia constituinte com o maior escândalo da razão, da justiça e da constitucionalidade jurada; que se arrogou a monstruosa atribuição de dar constituição a quem não devia dar, se abaixe a reformar o seu projeto por representação daqueles, que ele julga com o dever de lhe obedecer cegamente.

Se esta reflexão não vos convence de que o oferecimento do projeto às câmaras para ser discutido era ilusório, e sem o sincero desejo de o reformar conforme as anotações dos povos, eu me lembro, senhores, que a capital da Bahia depois de tantos sacrifícios de sua honra e dignidade, depois de tanto servilismo, não mereceu a reforma de dois únicos artigos que requereram, e tiveram do ministro do império a seguinte resposta: - "É conquanto desejasse S.M.I. poder responder já a esta representação, manda pela secretaria de estado dos negócios do império particular à sobredita câmara, que requerendo todas as outras, se jure o projeto sem restrição, não é possível por ora fazer nele mudança alguma, não havendo inconveniente em que se remetam essas observações, para quando se fizer a revisão marcada no mesmo projeto". (Cart. de 11 de março de 1822).

É por todas estas razões, que eu sou de voto, que se não adote e muito menos jure o projeto de que se trata, por ser inteiramente mau, pois não garante a independência do Brasil, ameaça a sua integridade, oprime a liberdade dos povos, ataca a soberania da nação, e nos arrasta ao maior dos crimes contra a divindade, qual o perjúrio, e nos é apresentado a maneira mais coativa e tirânica.