Vou empunhar a lyra e dedilhar tremendo
Um harpejo d′amor.
Para este fim augusto era attentado horrendo
Calar-se o trovador.
Embora o canto meu seja modesto e pobre
Tem rica inspiração;
Dedico-o a minha Mãe: — o sentimento é nobre,
Nasceu no coração.
Minha Mãe! minha Mãe! que favos de doçura
E que harmonia vae
No teu nome — Maria! És outra Virgem Pura,
Minha Mãe! minha Mãe!
Quando eu era no berço, a tua voz maviosa
Erguia um canto assim:
—« Dorme, meu filho, dorme o teu somno de roza,
Que estás junto de mim!
Depois eu fui crescendo e ensinaste-me, rindo,
As tuas orações.
Esse tempo, meu Deus, foi fugindo... fugindo...
Que tempo d′illusões!
Meu Pae, ao ver-te e a mim, sorria de contente,
Como elle era feliz!
Ai! breve nos deixou... Era velho e doente;
Foi Deus que assim o quiz.
Aquella fronte eburnea, aquelle olhar altivo
Penderam para o chão;
Mas elle não morreu! Eternamente é vivo
No nosso coração.
— Vive, descança em paz, Progenitor honrado
Aos pés do bom Jesus;
Tua esposa viuva e teu filho orphanado
Oram por ti á cruz.
Quantos momentos na vida
Voam na aza do soffrer!
Quanta esperança perdida
Nos faz do mundo descrêr!
Por uma hora de alegria
Eternidades de dôr,
Chamem á vida — magia!
Que en chamo ao mundo — traidor!
Hoje, gala, pompa, festa,
Prestigio, vaidade só!
— Amanhã d'isto que resta?
— Túmulos cheios de pó!
As garras da crua morte
Vestem de crepe o prazer;
É lei tyranna da sorte:
— Rico e pobre hão de morrer.
Ó, minha lyra, calemos
Os teus lastimosos sons.
E nós, minha mãe, choremos,
Só podem chorar os bons.
Deus, déste a lagrima ao triste
Para lhe mitigar a dôr,
Em nós só a dôr existe,
Nós choraremos, Senhor!
Passaremos assim este mundo, Senhora,
Às nossas afflicções carpindo mutuamente
Té que a mão da sorte
Venha disseminar em nosso peito frio
A esperança feliz de nos juntarmos todos,
Unidos pela morte.
1877.