Memórias de um pobre diabo/Primeira Parte - Capítulo 11
Na aurora da vida, ao alvorecer do amor, a primeira mulher que amei chamava-se — Aurora!
Como é poetica esta coincidencia, e como ficou bem phraseada! Quando eu for homem celebre ahi fica o thema para uma Epopéa.
Aurora morava no becco!
Relatei-lhe a occurrencia, guardando reserva ácerca da tapona.
Para ganhar mais no seu coração, fallei nos oitenta e cinco mil e quinhentos réis, acrescentando, se eu tal adivinhára houvera empenhado na loja do Sr. Moreira todos os teres e haveres de meu tio.
O galanteio influe naturalmente no coração da mulher, soube aos 16 annos, antes de saber latim, e, conseguintemente, antes de lêr Ovidio.
O numero do Camarão onde vinha inserto o meu artigo O homem deve ser sceptico, e o do Lagarto onde vinha a Ella, andavam comigo como talismans. Tirei do bolso o Lagarto e dei a Aurora para lêr os versos, declarando serem feitos quando pensava n'ella.
A rapariga ainda ignorava mais essa prova de amor, (que tão cara me sahira quando a dei á visinha).
A ultima quadra commoveu-a de uma vez: tambem era o sentimentalismo metrificado.
Que peito de mulher não commoverá esta quadra:
«Sê minha? Serei teu.... abre-me os braços....
Voemos deste mundo.... Sacuras
Fujamos do paul.... vamos, querida,
Fazer o nosso ninho nas alturas?!
Aurora lia soletrando palavra por palavra. Quando acabou de lêr eu estava com fome. Davam tres horas da tarde: