(André J. Renard)
A feira de Paris havia atraído de uma província longínqua um casal de salsicheiros afastados do negócio, o sr. e sra. Laripette. Transferindo o estabelecimento, haviam eles se encaminhado, indistintamente, para o galpão consagrado exclusivamente ao comércio de salchichas. E aí, nada lhes chamou tanto a atenção como uma grande máquina complicadíssima, cujo funcionamento era explicado pelo proprietário.
— Aqui tendes, senhoras e senhores, um mecanismo verdadeiramente maravilhoso, que faz, ele só, o trabalho de cinqüenta operários. Basta empurrar um porco vivo por esta porta, a porta n° 1, assim (e fez entrar um porco autêntico pelo orifício indicado), pôr a máquina em movimento... assim... e esperar um instante. E vê-lo-eis sair do outro lado, completamente transformado em salsichas, chouriço, presunto e miúdos de toda a qualidade. Os ossos são transformados em adubos e a pele em carteiras para dinheiro!... A operação está terminada. Se quiserdes vos aproximar deste estrado, vereis aparecer a mercadoria anunciada!
Boquiabertos, Laripette e a mulher chegaram-se, desconfiados, para ver o prodígio.
— Entretanto, senhores e senhoras — continuou o propagandista, — ides ver coisa ainda mais assombrosa. No caso de produtos obtidos não parecerem satisfatórios, é preciso dar atrás com a maquina, para engordar o porco de novo, ou corrigir, com ele vivo, o defeito verificado na mercadoria. Eu confesso, mesmo, que não tenho aqui senão um porco, e que é ele que serve diariamente nas minhas experiências. Vou, pois, reconstituí-lo, dando com a máquina para trás... assim...
Interessado no manejo do aparelho maravilhoso, o sr. Laripette curvou-se para a frente, afim de acompanhar com os olhos, até o último instante, o desaparecimento do presunto. Tanto, porém, se curvou, que foi apanhado por uma engrenagem formidável da máquina, a qual o arrebatou, em dois safanões, fazendo-o desaparecer no tumulto vertiginoso das rodas.
As mãos na cabeça, os olhos vidrados pelo terror, a sra. Laripette soltou dois gritos, e ia soltar o terceiro, quando o dono da máquina a tranqüilizou:
— Calma, minha senhora, calma. Não há perigo nenhum. Funcionando para trás como está agora, a máquina faz voltar todas as coisas ao seu estado primitivo e natural. Nessas condições, o seu marido não corre nenhum risco, pode ficar certa. Além disso, a operação está terminada, e a senhora vai vê-lo sair, são e salvo, por aquela porta, em companhia do porco.
E abriu-se a porta n° 1.
E saíram dois porcos.