Diremos apenas algumas palavras ácerca do periodo moderno da architectura.
No seculo XVII e no XVIII procurou-se imitar uma certa disposição architectonica, que havia prevalecido na Italia nas fachadas das igrejas, no ultimo quartel do seculo XVI, consistindo em collocar o portal no meio de columnas que abrangessem a largura da nave principal e as duas lateraes; depois em sobrepôr outra Ordem de architectura por cima da primeira, ainda que não correspondesse ao espaço occupado pela nave principal, onde as suas abobadas se erguiam acima dos telhados inferiores pertencentes ás naves lateraes.
Esta diminuição de largura dada á fachada, na parte superior, era disfarçada por um ornato accessorio do feitio de um S deitado, quartellas, para ligar a elevação da segunda Ordem com a parte inferior que decorava o portal, e ao mesmo tempo servia-lhe de contraforte.
Os jesuitas, que construiram n'essa epoca as suas igrejas adoptando esta disposição, foram os promotores principaes de tal incoherencia, sobrepôr as columnas que não correspondiam ás divisões dos andares. Por este motivo ficou designada Estylo dos Jesuítas, que foi adoptado nas igrejas do seculo XVII.
Para exemplo dâmos a gravura da igreja da Sorbonna (França), construida por ordem de Richelieu, de 1635 a 1659, a qual se compõe de uma Ordem corinthia na parte inferior, tendo por cima outra Ordem composita, limitada por um frontão, e sobre os lados as quartellas servindo de contrafortes para esconder a falta de ligações das naves lateraes com a decoração principal da fachada. A torre, com feitio de cupula, apresentava um tambor cylindrico.
Em Portugal, em todas as igrejas d'essa época, imitaram egual disposição. Os planos foram delineados sob a mesma influencia religiosa, e assim se construiram as igrejas de Santo Estevão, a do Espirito Santo, o seminario de Santarem, etc.A fórma interna era, em geral, muito simples. Constava de arcadas macissas separadas por pilares, algumas vezes decoradas de pilastras; pondo em communicacão essas arcadas da nave principal com as outras lateraes. Uma unica ordem de janellas se collocavam na parte superior, por cima d'essas arcadas; e ora de volta inteira, ora de verga horisontal, davam claridade á nave. As naves lateraes e as capellas correspondentes ás aberturas das arcadas recebem luz por janellas de egual feitio.
O interior da igreja de S. Sulpicio (França) mostra esta disposição, que era a mais seguida; portanto, não mostravam indicio algum do triforium, nem logar para a galeria, como se costumava construir no seculo XVI.
Edificaram-se torres de differentes fórmas. A cupula da igreja da Sorbonna mostra-nos as que ficam mais usuaes para os grandes edificios; para as outras de menor grandeza, adoptavam as torres em abobada hemispherica e lanternim, como se vê na gravura; as quaes foram muito communs até o final do seculo XVIII.
Os retabulos ornados com columnas e frontões foram empregados em toda a parte para decorarem os altares-móres, desde o fim do seculo XIII, e formavam verdadeiros monumentos na architectura moderna, que a moda havia introduzido tambem dentro das igrejas ogivaes. Foi d'elles que derivaram os elementos para as fachadas das igrejas modernas, as quaes, ainda que combinadas com arte, produziam todavia effeito um tanto theatral, pouco proprio da magestade da casa de Deus, não obstante terem apparencia vistosa, como se poderá julgar pela gravura da pag. 305 [fig. 287].
Apezar de que estes altares são muitas vezes pouco harmoniosos no estylo, convirá comtudo conserval-os como exemplar da original decoração da época.
Durante o periodo, de que tratamos, os tumulos eram notaveis pelo emprego de marmores de variadissimas côres.
Apparecem alguns com a fórma das antigas quilhas de navios, apresentando o bôjo dos dois lados; porém, as fórmas da época antecedente continuam ainda a ser seguidas, apparecendo por esta rasão as estatuas dos finados deitadas sobre as campas; porém o maior numero eram representados de joelhos como se estivessem em oração, pag. 307 [fig. 289].
Em Portugal são raros os tumulos d'essa época, em que appareçam representados em vulto os finados que n'elles jazem.
Se lançarmos a vista sobre a architectura civil da França, da Allemanha e da Belgica, no seculo XVII, veremos que se construia grande numero de casas com elevadissimas empenas com os lados em fórma de degraus e rematadas por grandissimas quartellas, que datam do seculo XVI, pag. 308 [fig. 290].
A empena da gravura que damos para exemplo d'esta especie de construcções é de 1620.No seculo XVII, as casas mais importantes tinham as escadas com patamares mui espaçosos; e os pontos de apoio eram executados com demasiada grossura. Os balaustres da grade da escada tinham a fórma quadrangular e o seu corrimão era tambem de grande grossura.
As duas gravuras das pag. 309 [fig. 291] e 310 [fig. 292], mostram o estylo das casas do seculo XVII. Na primeira gravura, já as janellas não têem pinazios de cantaria, assim como as vidraças não têem os caixilhos guarnecidos de chumbo para segurar os vidros, sendo substituidos por pinazios de madeira. As trapeiras conservam as primitivas fórmas, mostrando os prumos recortados em fórma de quartellas, e os seus frontões de feitio circular ou triangular, conforme eram empregados no seculo XVI. Os pannos das chaminés tinham a fórma quadrangular, e terminavam em frontões.
A outra casa, que é de estylo mais adiantado, pois data de 1664, apresenta um bello portal terminado por frontão, os telhados com bastante elevação, e as chaminés extremamente altas.
Estas combinações são caracteristicas do seculo XVII.
Ha nos suburbios de Lisboa, no palacio de Palhavã (que foi por nós restaurado e ampliado no anno de 1862), um bellissimo portal, no estylo Toscano, de perfeita composição e obra de acabamento apurado, e haverá poucos nos outros paizes que lhe possam ser comparados, e sem duvida o celebre architecto Vignola não se negaria a firmar com a sua assignatura o desenho para esta construcção, tanto mais por ser delineado segundo a escola d'este artista.
O estylo da primeira metade do seculo XVII, o qual predominou durante o principio do seculo seguinte, apresenta um caracter grandioso, e os monumentos d'essa época distinguem-se, pelo seu nobre aspecto, das outras edificações mais importantes do tempo presente.
As outras gravuras apresentam construcções pertencentes ao ultimo quartel do seculo XVII, e seguem a ordem da antiguidade de suas edificações. A primeira gravura pertence a uma azenha, posto que na sua fachada parecerá um palacete. É do anno de 1664, pag. 311 [fig. 293].
As duas partes symetricas flanqueadas por pilastras e o frontão separado por muitas ordens de frizos sobrepostos, (de pessimo effeito) que occupa a parte central, parecem caracterisar uma data um pouco mais antiga, posto que este estylo se perpetuou, em alguns monumentos, até ao principio do seculo XVIII.
A parte da casa de Harcourt, que representa a outra gravura, pag. 312 [fig. 294], pertence ao principio do seculo XVIII, mas foi edificio delineado com mais talento e apresenta um aspecto mais regular e nobre. No seculo XVIII a architectura modificou-se sensivelmente, e o grande numero dos edificios d'esta época está bem patente, e será escusado descrever o seu caracter architectonico.
No actual seculo XIX, tem-se feito bastantes alterações na architectura, e por isso não apresenta um caracter bem distincto, o que se deverá attribuir ao estado presente social; portanto, não se póde definir a fórma do estylo que deverá representar a sua architectura.
Finalmente para que qualquer estudo offereça sempre interesse para ser cultivado pelos estudantes, é preciso não se explicar tudo aos principiantes, sobre a materia de que se occupam, mui principalmente n'esta moderna sciencia; para que a curiosidade de a profundar lhes desperte o desejo de se instruirem cada vez mais, o que lhes facilitará gradualmente o seu desenvolvimento; afim de evitar que uma demasiada applicação venha a produzir-lhes o cansaço em conhecer todos os segredos da archeologia, porque o estudo se não é facil, é sobejamente agradavel e util. Por minha parte, julgar-me-hei feliz se as noções que deixo n'estas paginas, poderem suscitar o amor a tão profícuos estudos, porque d'ahi, no meu entender, virá engrandecimento para o nosso fim.