Rostinho brejeiro coroado por uma chapéu pequenino, em que se casam com arte minúsculas flores de seda, a graciosa Ginette desce, elegantemente metida no seu levíssimo vestido de verão, aquela pequena ladeira que vai dar, em baixo, na Avenida Beira-Mar. Pequenos e alígeros, os seus sapatinhos estalam no paralelepípedo, como aves que bicassem a pedra. É noite, as estrelas brilham nas alturas, e Ginette convida, de passagem, a cada transeunte que encontra:
— "Viens, mon cheri!
Ö transeunte não lhe dá atenção, mas isso não a ofende. Se ele, depois, voltar, será a mesma, como seria para outro. A sua profissão está abaixo das injúrias, que ela recebe, sempre, sem protesto. Em baixo, na praia, junto a um poste de parada, um cavalheiro espera o bonde.
Sorriso provocante na boquinha avivada pelo "rouge" recente a francesinha convida:
— "Um baiser"... Vinte mil réis... "Viens"...
Ante essa insistência, o cavalheiro levanta a bengala em que se apoia, batendo, forte, na pena esquerda, até acima do joelho. Um ruído seco, abafado pela casimira da calça, faz sentir à rapariga que a perna não tem carne, nem osso.
— "Une jambe de bois?..." "Vous"? — fez a francesinha, admirada.
Ginette é, porém, generosa. Generosa ou interesseira; quem sabe lá?... E é por isso que, com uma graça toda sua, toda parisiense, faz um gestosinho de cabeça, no rumo da casa, lá em cima na ladeira:
— Dez mil réis... "Viens"?