Eu não trajo o burel do magro cenobita
Nem me posso infligir crueis macerações;
Mas não rio d'alguem que busca a paz bemdita
No seio casto e bom das grandes solidões.
Bem sei que ha na montanha aromas penetrantes
E certas vibrações que podem fazer mal;
Mas se é preciso Deus, direi que é melhor antes
Amal-o com fervor no templo universal!
Em quanto sobre o altar das serras azuladas
Mil lampadas do céo derramam toda a luz,
Nas velhas cathedraes, já meio arruinadas,
O Tempo,—o grande verme!—até devora a cruz!
Depois é facil vêr, por entre os arabescos
Que a arte sensual traçou com tanto amor,
Ás vezes, o sorrir dos Satyros grotescos
Pungindo cruelmente a face do Senhor.
Ou mais; podemos nós voar todos captivos
Do sereno ideal, d'aquelle summo bem,
Ao vermos tanta vez os Faunos mais lascivos
Olhando de revez a virgem nossa mãe?!
E ainda mil traições: as musicas, as flôres
Os lindos seraphins voando todos nús;
Da sêda que se arrasta os languidos rumores
Do incenso as espiraes; os turbilhões de luz!
Oh! visto haver de tudo; aromas e decotes,
O vinho scintillante, a viva luz do gaz;
Que a vossa rouca voz, pomposos sacerdotes,
Não cante apenas Deus; que solte alguns hurrahs!
O fumo d'essa festa, a mim, pouco me assusta.
Se eu quero alguma vez fugir do pó, voar,
Eu tenho o val profundo ou a floresta augusta,
As montanhas, os céos, e o bello, o vasto mar!
Da casta natureza ó templo gigantesco,
Tu és mais amplo, sim; mais livre, muito mais!
O meigo e doce olhar do Christo romanesco
A multidão gentil não chama aos teus umbraes.