Procissão dos jiraus
Naquele mesmo dia, à tarde, animaram-se de novo as encostas do Cambaio. O fragor dos combates, porém, trocara-se pela assonância das litanias melancólicas. Lentamente, caminhando para Canudos, extensa procissão derivava pelas serras. Os crentes substituíam os trabalhadores e volviam para o arraial, carregando aos ombros, em toscos pálios de jiraus de paus roliços amarrados com cipós, os cadáveres dos mártires da fé.
O dia fora despendido na lúgubre pesquisa, a que se dedicara a população inteira. Haviam-se esquadrinhado todas as anfractuosidades, e todos os dédalos rasgados entre pedras, e todos os algares fundos, e todas as taliscas apertadas...
Muitos lutadores ao baquearem pelas ladeiras, em resvalos, tinham caído em barrocais e grotas; outros, mal seguros pelas arestas pontiagudas das rochas atravessando-lhes as vestes, balouçavam-se sobre abismos; e, descendo às grotas profundas, e alando-se aos vértices dos fraguedos abruptos, colhiam-nos os companheiros compassivos.
À tarde ultimava-se a missão piedosa.
Faltavam poucos, os que a tropa queimara.
O fúnebre cortejo seguia agora para Canudos...
Muito baixo no horizonte, o sol descia vagarosamente, tangenciando com o limbo rutilante o extremo das chapadas remotas, e o seu último clarão, a cavaleiro das sombras, que já se adunavam nas baixadas, caía sobre o dorso da montanha... Aclarou-o por momentos. Iluminou, fugaz, o préstito, que seguia à cadência das rezas. Deslizou, insensivelmente, subindo, à medida que lentamente ascendiam as sombras, até ao alto, onde os seus últimos raios cintilaram nos píncaros altaneiros. Estes fulguravam por instantes, como enormes círios, prestes acesos, prestes apagados, bruxuleando na meia luz do crepúsculo.
Brilharam as primeiras estrelas. Rutilando na altura, a cruz resplandescente de Órion alevantava-se sobre os sertões...