Os Tuiciais: um clássico do futebol paranaense

Tuiuti versus Comercial editar

Quando a dupla jogava era dia de festa editar

Começou há quatro décadas, num dia 11 de julho. Em 1965 o Município de Cascavel estava com apenas doze anos de algo que se viveu, que se vivenciou. A cidade se desenvolvia rapidamente graças ao impulso da madeira e a agricultura apenas começava a sair do estágio de subsistência, mas ainda não sonhava com a forte agricultura de exportação que viria na década de 70.

Falar em cooperativismo na época era o mesmo que confessar adesão ao “comunismo”. Nesse ano as equipes de futebol do Tuiuti Esporte Clube e da Associação Atlética Comercial fariam o primeiro jogo de uma série que a partir de então criaria grandes paixões e rivalidades, mas também muita festa esportiva na cidade.

No início da década de 60 começaram a ocorrer fortes divergências no interior do Tuiuti Esporte Clube. Se quanto à parte social todos estavam mais ou menos de acordo, no setor esportivo havia pelo menos dois problemas: primeiro, todos queriam jogar no time principal do clube, que era muito bom, mas não havia lugar para tanta gente; depois, o setor esportivo se tornou praticamente independente do clube e passou a criar suas próprias regras, causando reações adversas na diretoria social.

As divergências se aprofundaram até que depois de uma derradeira (Militar) pequeno duelo dentro de uma batalha maior foi fundada a Associação Atlética Comercial, uma dissidência do Tuiuti Esporte Clube, em 9 de abril de 1964. O Tuiuti já havia jogado − e sempre vencia − com uma entidade informal, o Caninana, que desapareceu para ceder ao clube Comercial sua sigla e cores.

O ano de 1964, além de registrar na cena nacional a instalação de uma ditadura, mostrou a cidade de Cascavel em franco desenvolvimento, mas o Município perdendo área: também em abril o importante distrito de Aparecida do Oeste se emancipou de Cascavel, recebendo o nome de Capitão Leônidas Marques. Cascavel perdia ainda a Sadia, que decidiu se instalar em Toledo, mas ganhava a Biblioteca Pública Municipal Sandálio dos Santos.

Nos meios esportivos, começava já no final de 1964 a ser cogitada uma partida para ver qual clube era mais forte: o Tuiuti ou o novo Comercial. Interessada em se fortalecer, a diretoria da Associação Atlética Comercial desafiava o “gigante” Tuiuti para medir forças e mostrar a que veio. O Tuiuti a princípio não queria aceitar uma disputa sem motivo: interessava-se apenas em disputar certames oficiais.

Foi nesse clima de desafio e recusa que terminou o ano de 1964, mas 1965 começou sob o domínio do espírito esportivo. Em janeiro seria disputada, em plenas ruas empoeiradas da cidade, a primeira prova automobilística da história − as Duas Horas de Cascavel, no estilo Le Mans. Os pilotos se alinhavam longe dos carros e corriam para eles. Quem desse a partida antes saía na frente.

Em março era inaugurada a Ponte da Amizade, em junho surgiam os novos distritos cascavelenses de Cafelândia d’Oeste, Palmitópolis, Rio do Salto e São Salvador. Na época, a cidade contava apenas com três hospitais e dois ambulatórios médicos. A rede de água supria apenas 294 residências. O perímetro urbano tinha só 10 mil metros quadrados de ruas asfaltadas.

O Paraná estava em recessão, mas Cascavel crescia: a Industrial Madeireira do Paraná, que tinha sede em Foz do Iguaçu, estava pensando em se transferir para Cascavel. O coronel Lapa promovia uma forte operação de desarmamento no interior e prendeu indiscriminadamente tanto jagunços quanto posseiros que andavam armados.

Também em 1965 uma missão do governo japonês veio estudar as possibilidades de Cascavel e era concluído o Colégio Wilson Joffre. Foi nessa Cascavel dinâmica, desafiadora e com uma população muito jovem − os pioneiros sulistas que haviam chegado na década de 40 estavam na faixa dos 30 a 40 anos − que se deu o primeiro grande embate entre as equipes do Tuiuti, que finalmente aceitou as provocações, e da Associação Atlética Comercial. O Comercial, a partir daí, tornar-se-ia uma das grandes forças sociais e esportivas da região.

Goleada no primeiro jogo editar

No modesto Estádio Ciro Nardi foram disputados todos os Tuiciais

O Tuiuti não costumava perder para o Caninana e também repetiu a dose com a Associação Atlética Comercial durante 1965 e 1966. A primeira partida que recebeu o nome “Tuicial”, em 11 de julho de 1965, foi vencida pelo Tuiuti de goleada: 4 a 1. A outra partida do ano, em 18 de julho, apontou a vitória azul por 3 a 1, evitando uma terceira partida de tira-teima.

Durante 1966 o Tuiuti continuou invicto, mas tomou um susto na primeira partida do ano, em 6 de março, quando ocorreu o empate em 2 a 2, e em 27 do mesmo mês, com um novo empate em 1 a 1. Parecia que o equilíbrio já havia sido conquistado pelo Comercial, quando se sucederam três novas vitórias do Tuiuti e confirmaram o que a população começou a chamar de “tabu”, ou seja, o Comercial jamais conseguia vencer o Tuiuti: 2 a 0 em 17 de abril; 2 a 1 em 21 de agosto; e novamente 2 a 1 em 18 de dezembro. Mas um novo ano viria e a partir daí o que parecia impossível aconteceu.

A 5 de março, em meio a uma festa monumental, o Comercial venceu o Tuiuti por 2 a 1, devolvendo o placar das duas últimas derrotas. Uma semana depois, no tira-teima, houve um empate em 3 a 3, numa partida intensamente disputada. Mas em 29 de junho acontecia a primeira e única goleada do Comercial sobre o Tuiuti nos clássicos locais: 4 a 2. Em 1967 e 1968 o novo “tabu” da invencibilidade do Comercial se manteve por um bom tempo: a 17 de setembro de 1967 venceu por 1 a 0, em 14 de abril de 1968 voltou a vencer, por 2 a 1.

Em maio de 1968 ocorreram três partidas, com um empate em 0 a 0, uma vitória do Comercial, por 2 a 1, e o Tuiuti finalmente rompendo o novo tabu criado pela invencibilidade do Comercial, vencendo por 2 a 0 em 1° de junho. Mais tarde os dois clubes declinaram de suas seções esportivas em favor de um time único levando o nome da cidade. Era o fim dos Tuiciais.

A rivalidade era muito grande entre os torcedores, como contou Mário Thomasi, presidente do Tuiuti no auge da dissidência:

“Uma pessoa importante foi o senhor Waldemar Bomm, que fundou um clube que se chamava Canina, antes de surgir o Comercial, para o qual cedeu os uniformes com siglas. O senhor Fredolino Marques foi um dos entusiastas e também Lauri Sonda, já na fundação do Comercial. Havia uma dissidência de alguns sócios do Tuiuti que, não satisfeitos com a administração, depois de ter fundado o Caninana, com o passar do tempo acabaram se associando ao Comercial. Mas entre as diretorias do Tuiuti e Comercial havia um perfeito entrosamento. Após os clássicos as diretorias se reuniam para fazer a divisão da renda, não tendo inimizade pessoal com ninguém”. ,,,,

Fonte: Alceu A. Sperança, jornal O Paraná, seção dominical Máquina do Tempo)