Irmãos Bertoli
editarLyrio e Zé foram fortes agentes do desenvolvimento político e cultural da região
editarUm nome precisa ser lembrado sempre que se contempla Itaipu, percorre-se a BR-277, assiste-se à pujança do sistema cooperativista e se mantém o sonho de construção do Aeroporto Internacional do Médio-Oeste. Esse nome é Lyrio Bertoli, o primeiro deputado federal eleito pelos cascavelenses.
Genro do madeireiro Florêncio Galafassi, Bertoli e seu irmão José Bernardo foram responsáveis pela arrancada do desenvolvimento cultural e político de Cascavel, ao lado de figuras como Sandálio dos Santos, José Neves Formighieri, Celso Formighieri Sperança e Wilson Joffre.
A luta pela construção do aeroporto regional entre Toledo e Cascavel, por exemplo, não se trata de nenhum movimento novo, mas de uma reivindicação sustentada há mais de 40 anos por lideranças de ambos os municípios e “aparentemente sabotada por pessoas das duas cidades”, segundo o ex-vereador toledano Orlando dos Santos, que em abril de 1968, junto com o então deputado federal Lyrio Bertoli, além de outros membros da Câmara, defendia a construção de “um aeroporto asfaltado” entre as duas cidades, mais precisamente na região de Sede Alvorada.
“O Bertoli lamentava também a adoção de soluções isoladas, ou seja, a construção de dois aeroportos e pregava a união do Oeste na defesa dos interesses comuns, mas pelo jeito jamais foi ouvido por algumas lideranças”, disse Orlando dos Santos, um dos maiores defensores de um único aeroporto.
Foi interessante a forma com que Lyrio Bertoli foi eleito o primeiro deputado federal do Oeste do Paraná. Era um tempo em que os deputados não eram candidatos de si mesmos, de suas empresas, veículos de comunicação social ou seitas religiosas, como ocorre muito na atualidade. Então, política era a atividade superior de atender aos interesses das comunidades em formação.
“Havia saudável rivalidade entre Toledo e Cascavel”, contou Bertoli. “Para o êxito então alcançado, além da união de forças, existiam outros fatores. Até forças ocultas às quais tal união não interessava. Para o êxito daquelas eleições – Egon e eu – diversos fatores contribuíram: o primeiro foi o desejo do Oeste em determinar sua identidade. Para os políticos da capital, nós pertencíamos ao Sudoeste. Depois de eleito, provei o contrário”.
A região Oeste, apesar de verídicas as rivalidades locais, afirma Lyrio Bertoli, conseguiu superá-las “pelo brio dos pioneiros, gente jovem, vinda do Sul e do Norte, porque os velhos, em sua maioria, permaneceram na casa materna”.
“O segundo fator, silencioso, discreto e profundo, mas determinante, foi o sofrimento do povo, cansado de injustiças, de promessas não cumpridas, somente renovadas, que como num teatro ou num telão de hoje, se expunham aos olhos de quem observava as delegacias, os fóruns, os cartórios, a boa fé ludibriada na compra e venda de posses, ou ouvia os gemidos exalados com a dor de quem havia perdido tudo, casebres, roças, plantações e muitas vezes, entes queridos. Além de aspectos legais, econômicos, políticos, o telão tinha a sombra e fundo avermelhado de sangue. Sangues diversos. Lembrem-se do que ocorria na região de Cafelândia, Iguaçuzinho, Nova Aurora, Catanduvas, Banhadão em Matelândia, na Lopeí, entre Toledo e Cascavel, em Flor da Serra, Medianeira, em diversos focos cá e acolá. Revolta sufocada na garganta dos injustiçados. Dramatizo? Não. A realidade era pior”.
"Uma loucura que deu certo"
editarLyrio Bertoli traça um perfil da região antes dos conflitos de terras, que poderiam simplesmente ter sido resolvidos através do diálogo e não da força das armas e do uso da polícia para reprimir os posseiros.
“Uma empresa da região, detentora de milhares de alqueires de terras, cobertos de pinheiros, a nossa legítima araucária, possuía em suas propriedades centenas de posseiros – nenhum invasor, com os quais foram feitos acordos, a maioria por meu falecido irmão e por mim. Aprofundem-se nesses episódios, e vereis que jorrava sangue, sangue de gente e sangue de ouro, extraído de nossos pinheirais, de nossos perobais e de nossos ipês. O produto de uns ficou no Oeste, produzindo milho, sustentando nossa suinocultura de então, depois a soja, trigo. E o outro de nosso pinheirais? Que importância restou para o Oeste o tal ciclo da madeira? A bem da verdade, devo reconhecer que meu sogro, como outros diretores de empresas florestais, foram sensíveis às causas sociais”.
“Entre o povo de então, alguns assistiam o teatro, observavam, sem nada por reclamar. O movimento da política regional representou a tribuna para o desafogo, firmando nossa identidade e servindo para nossa defesa. Depois de eleitos, (Egon) Pudell e eu a usamos como tribuna legal, com a força do parlamentar, exigindo justiça, estradas, escolas, preços mínimos, delimitando a faixa de fronteira, o aproveitamento dos saltos das Sete Quedas, com projeto legislativo para tanto, adaptando o plano nacional de viação, fomentando a formação de cooperativas, inclusive autorizando desconto no imposto sobre a renda às empresas que aplicassem no florestamento e reflorestamento etc”.
Sua eleição para a Câmara Federal, diz Bertoli, “foi uma loucura que deu certo, nascida de uma plêiade de homens daquela época, origem do hoje valoroso povo oestino. Tal qual nas placas de inauguração de grandes obras, fica o nome do governante. Nelas não caberiam as milhares de vidas que a construíram”.
Eleito em 1962 e reeleito em 1966, Lyrio Bertoli exerceu o mandato até 1970, quando abandonou a vida pública.
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(Fonte: Alceu A. Sperança, jornal O Paraná, seção dominical Máquina do Tempo)