do poeta da corôa,
ai! é lagrima que escalda,
pensamento que não vôa!
Deus, mulher, na tua face
gravou do lirio a candura
mas do teu peito n'agrura
não vive nenhuma flôr!..
Porisso tu com ternura
não sabes fallar d'amor!
Porisso tu nunca fitas
a vista no firmamento
nem mandas n'aza do vento
um mavioso queixume:
porisso nunca um momento
tens das estrellas ciume!
A.
O pai e o filho
Continuava Custodio da Cunha a passear no quarto. Rufina entrou assodada, dizendo:
― A mãe saiu de carro sósinha?!
― Saiu, respondeu o ancião. Vai buscar para viver comnosco uma menina muito bôa e muito infeliz. Has de consolal-a de suas tristezas e amal-a como irmã.
― Ah!.. quanto serei feliz!.. Com que gosto abraçarei a minha irmã adoptiva!...
Maximino entrava ainda agitado. Não podia disfarçar inteiramente o seu alvoroço. O pae carregou o sobrôlho e replicou a Rufina:
― Não se trata de gosto; mas de consolações e de juizo. Não podemos ser felizes por termos de viver com desgraçados. Retira-te Rufina, tenho que dizer em particular a teu irmão.
Maximino sentiu um calafrio em todo o corpo. Forcejou por senhoriar suas commoções.
― Ella está salva ― pensava elle ― é o principal.
Rufina tinha saido. O ancião assentou-se, crusou os braços e olhou fixo para o seu filho. O mancebo tinha socegado pouco a pouco, e sofreu este exame sem pestanejar. Respondeu ao olhar interrogador com uma vista serena e suave. O coração nadava-lhe em venturas.
― Maximino ― disse Custodio da Cunha com modo sério, mas não carregado como ha pouco ― d'hoje em diante vai viver debaixo do nosso tecto uma orphã desvalida e infeliz.
O mancebo córou, mas não desviou os olhos dos de seu pae. Este continuou com voz firme:
― A honra e o dever não são brincos de creança. Offerecemos um asylo honesto a uma donzella desditosa, é preciso que este asylo seja o que se lhe offerece.
Maximino continuava a estar sereno. Seu pae proseguiu em tom mais forte, mas não colérico:
― E sabes, Maximino, como o homem honrado e brioso se porta com a menina que se abriga na casa de sua familia?
― Sei, meu pae.
― Bem, acredito na tua probidade. Sabes tudo a que te obriga a confiança que em ti deposito?
― Sim, meu pae. Nunca lhe darei occasião de arrepender-se d'essa confiança.
― Muito bem.
― Meu pae, tinha uma coisa a dizer-lhe.
― Dize, meu filho.
― Não é por volubilidade que lhe vou fazer um pedido. Tenha a bondade de me arranjar n'alguma casa de commercio no Porto, ou permitta que eu vá para o Brazil.
― Que mania é essa agora?
― Tenho considerado que fiz mal em me servir do valimento de minha mãe para seguir um modo de vida differente d'aquelle a que me destinava meu pae. Hoje já não tenho antipathia ao commercio. Estou prompto a sujeitar-me a tudo.
― Parece-te talvez que um caixeiro com alguns vintens no bolso é mais feliz do que um estudante com elle vasio?
― Não, não tenho ambições.
― Então já aborreces os estudos?