A esperança
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Assentado ao pé da fonte está o Ermita. É um velho de pequena estatura, fronte calva, magra, e macilenta. A expressão dos olhos já um pouco encovados, é d'uma doçura evangelhica! Tem aberta, sobre os joelhos a Biblia, mas não lê, está olhando para um caminho estreito que da planicie conduz á sua pobre morada; pelo qual caminhavam duas jovens, e uma velha.

Já os nossos leitores sabem quem ellas são, por tanto iremos vêr a recepção que lhe fez o padre.

― Como são bôas, minhas meninas, em virem visitar o pobre Ermita!

― Como passa o nosso bom amigo? ― perguntaram as duas amigas a um tempo, pegando nas descarnadas mãos do velho.

― Soffrendo sempre, minhas filhas; mas v. exc.as tambem me parecem tão abatidas! têem tido algum incommodo?

― Ah! snr., pois não sabe a desgraça que nos opprime? ― disse a filha do Marquez ― meu irmão talvez já não exista!

Já não exista! ― repetiu o velho com admiração ― mas como é isso minhas filhas? aonde está elle? que lhe succedeu?

Nem uma das meninas lhe respondeu, por que os soluços embargaram-lhe a voz!

A velha Rosa foi a que contou ao padre o que havia succedido.

Sentidas lagrimas rôlaram pelas cadavericas faces do padre Francisco: elle amava o mancebo como se fôra seu filho.

― Resignação com a vontade de Deus minhas filhas, ― murmurou o bom velho limpando as lagrimas ― A Virgem dos Remedios ha-de melhorar Paulino, ha-de ouvir as nossas supplicas, vamos fazer-lh'as.

E o padre e as tres mulheres entraram na Ermida.


 

 

Luzia e Melania


(Traducção de A. P. Y. da Silveira)

(De pag. 309.)

Grita Melania: levam para o seu quarto, a qual tinha perdido os sentidos: e tornado que ella tivesse a si, triunfa a sua generosidade. Torna apressada ao aposento da irmã.

― Perdoa, diz, querida irmã, a minha fraqueza: avigorado tenho o alento, e já posso responder por mim. Sim, não ha duvida; a minha ventura constituira eu em vêr-me esposa do conde.... Melania.... Tenho-lhe amôr, e ser-me-ia possivel dissimulal-o? E' certo que tudo descobre uma desgraçada paixão; mas que seria a minha dita, se a vida te houvesse de custar? Ah! que bem sinto de mim que a amizade em meu coração pode igualar o amôr.... Querida mana, tira os olhos do meu pranto, ouve sómente os meus suspiros: não olhes para estes terriveis combates, para as mortificações de minha alma, e revive tu para ser amada de tua irmã, de tua amiga.

― Ah! mana, que quanto mais sacrificios me fazes mais devo armar-me contra a tua bondade, contra mim mesmo. Tamanha virtude só serve de constituir-me odiosa, e culpada no meu proprio conceito. Sim, peço-te encarecidamente que deixes quebrar o fio d'uns dias, que detesto, e vive para ter dó de mim, para amar-me... para desposar-te.... Não pode Melania acabar, e cahiu-lhe nos braços sua rival toda chorosa.

Não deixava Luzia a sua irmã que sempre porfiava em dar iguaes mostras de melindre, e grandeza d'alma. E ha por ventura para a fraqueza humana maior esforço, nem mais digno de admiração do que subtrair-se qualquer a um sentimento que lisongea, que enche um coração, e querer á custa da sua propria ventura a alheia? Não é até onde póde chegar o heroismo?

Minha irmã, disse Luzia a Melania, algum tempo depois d'uma confissão tão cruel, entrei comigo a perguntas; experimentei o meu coração, o qual creio que poderá estar pelo que eu lhe ordenar. Prometter-te mais, seria enganar-te, seria abusar de mim mesmo, Minha querida