A esperança
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— Eu não sei o que isso é, snr.a Brizida, mas o que lhe posso dizer com certesa é que tudo isso é feito por gente viva, fosse ella qual fosse, porque diz a minha ama: — Espirito que vai, não volta.

— Ai! bento nome da Santissima Trindade! — murmuraram as tres velhas — tua ama está aqui, está no inferno!

— Por não crer em espiritos? — procurou a rir a rapariga. — Se elles não voltam...

— Ai, cruzes, que mafarrico de rapariga esta!!

— Deixem-a fallar a ella, e á ama; dizem que não boltam cá as almas do outro mundo, mas por casa as tem trazido...

— Não? — procurou a rapariga admirada.

— Sim, sim. Pois eu não oubi dizer ha dias a dois cabalheiros que iam passando, e que vinham de casa de tuas amas: — Muito esprituosa é a menina Vicentina...

— Então vocemecês que entendem d'isso?

— Entendo o que toda a gente ha de entender — que a snr.a D. Vicentina é muito annexa aos espritos.

A rapariga soltou uma gargalhada.

— Riste, grandecissima tola?

— Podera não rir, snr.a Brizida; ha! ha! ha!

— Então tu, minha alambicada, que entendes do dizer dos cabalheiros?

A rapariga ia a responder, quando n'um movimento que fez, deu com os olhos em um guapo mancebo que estava parado em frente da escada, e que ouvia com toda a attenção a conversa das velhas, e da rapariga.

— Ai, o snr. Antoninho! — exclamou Isabel.

— Quem é aquelle petimetro? — procurou a snr.a Brizida.

— E' o primo da minha ama nova, aquelle com quem ella está para casar. (Continua.)

 
A filha da baronesa

Conto romantico
 

 
I
 

— Anda, Arminda, prepara-te que são horas d'ir para o baile — dizia para uma joven, uma senhora mais idosa, mas muito coquête e perfumada.

— Espere lá mamã — tornava a filha — não sei para quê, tanta pressa. Ainda nem se quer chegou o papá.

— Que temos nós com isso? E' muito bôa! Eu hei-de ir quando quizer e gostar, percebeste? Guarda a tua sabedoria para outra occasião. A gente, quando quer ser estimada, porta-se com toda a outra gente.

— Então eu que crime commetti? A apostar que se tracta d'algum anathema da fulminação? O que eu disse ha pouco, repito-o agora: a mamã não é a livre senhora de suas acções... a mamã tem uma tutella superior que lhe veda os passos, e ai do socego d'esta casa, se ella suspeitasse mesmo de leve dos pequenos tombos que a mamã tem dado junto do abysmo. Não me entende? Quer que me explique?

— Não é necessario. Eu não sou tão ignorante como tu me fazes. Não tive principios, é verdade; mas tenho tanta ou mais honra do que aquellas que se affizeram a estudar desde o berço. Pensas tu que os homens gostam d'uma mulher que sabe meia duzia de bonitas palavras? Boa vai ella. Vale mais uma contrabandista, que diz quatro asneiras, mas que tem o canto da caixa coberto d'amarellas, e a bolsa bem quente, do que uma menina delicada, que sabe de cór os dicionairos e quantos cartapacios ha.

Teria rasão, a snr.a baronesa d'Azambuja? Qual tinha. Enganava-se muito redondamente. Afóra meia duzia de loucos ambiciosos, ninguem quereria ligar-se a uma mulher estupida, que questionasse continuadamente a proposito da mais insignificante questão. Uma mulher d'estas não póde fazer feliz homem algum. A intelligencia é mais apreciavel que o mais recheado de todos os thesoiros.