A esperança
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no como um ferro em braza, e um sorriso amargo lhe assomou aos labios!

— Estou a receiar que meu pai me não deixe realisar o casamento, continuou Eduardo. Apesar de Clotilde ser pobre, e valer por isso muito menos, eu aprecio as suas boas qualidades e sou grato á sympathia que ella parece ter por mim.

Paulino nada respondeu.

— Meu amigo, continuou o estouvado Eduardo, visto que me não acompanhas a caza do visconde, não me demoro mais porque o calor vai a crescer.

Eduardo sahiu, e Paulino foi fechar-se no seu quarto.

— Ella ama-o, repetia elle passeaindo agitado, e aquelle coração de lama não sabe apreciar um amor d'aquelles!! E eu .heide ver colher por outro a mimoza flor que eu com amor e respeito, via crescer! Só ouzava comtemplal-a de longe; adoral-a como se adora uma divindade. Nunca lhe fallei de amor. suppondo que o meu halito ao pronunciar aquella palavra, a faria murchar qual sensitiva! e agora tenho de contemplar o paraiso do meu rival ...

Bateram á porta do quarto do mancebo. Era Josefina que lhe vinha dizer que tudo estava prompto para partirem.

Paulino chamou aos labios um sorrizo de satisfação, e acompanhou sua irmã ao quarto do Marquez. Depois de o abraçarem sabiram para a Salgueiroza.

(Continua.)

 

 
Adeus

Ao meu adorado Pai
 

Tanto se sente na morte,,
Quanto na ausencia se sente,
Se a morte é auzencia eterna.
A auzencia é morte apparente.

Julia Castilho.


Adeus dias que breves passasteis,
Semeados de paz e ventura,
E tão cheios de meiga ternura
Que no ceu eu julgava viver!
As caricias d'um pai eu gosava,
Seu amor minha dita fazia o
A tal ponto, que até me esquecia
Longa ausencia que eu tinha a soffrer!..

Mas em breve esse dia fatal,
Repassado de triste afflicção,
Appar ceu, e no meu coração,
Da saudade os espinhos cravou!
E tão fundos que o sangue gotteja,
E em prantos de fél convertido,
Fez trocar o prazer n'um gemido,
A ventura em soffrer transmudou...

E depois esta ausencia tão longa,
N'um escuro sodario envolvida,
Deita a palma de martyr á vida;
Faz os dias em seculos trocar!
Qual phantasma de negro me surge
N'essas noites que lentas se arrastam
E nos dias tão tristes que passam
Sem que eu possa o meu pai abraçar!

Hade o sopro tão triste do outomno
Congelar-se nos montes d'além
Hade vir o inverno tambem
Com seu sceptro de ferro assentar-se
Sobre as ruinas que o outomno deixou
Hade o vento bramir furioso;
Mas depois d'este tempo horroroso,
Tornará a natura a animar-se.

Findará o outomno, o inverno;
Hade a quadra florente lindar,
Sem que o peito me venha animar
Um affago do pai adorado!
Hão-de em flòr os espinhos mudar-se,
Hade tudo contente sorrir
Sem que eu possa no leito sentir,
Meu soffrer n'um sorriso trocado.

Estes bosques tão nús, que mal vestem
Pobres folhas perdidas da côr.
Tornarão a ter viço, e verdor,
Sem que tu, ó meu pai extremoso
Ao lár patrio de novo regresses!...
E eu heide esta ausencia soffrer?
Hade o pranto amargoso correr
Sem que chegue esse tempo ditoso?