A CIDADE E AS SERRAS

não ter peixe! Mas quê! ali na Serra era impossível, ainda a peso de ouro, ter peixe, a não ser a pescada salgada, ou o bacalhau. O excelente Rojão, com aquele seu modo, tão suave que cada sílaba para correr mais docemente parecia lubrificada com óleos santos, lembrou que o Sr. D. Jacinto possuía uma larga faixa do rio Douro com privilégio para a pesca do sável. Jacinto não sabia, nem imaginava que houvesse sáveis... O Dr. Alípio não se admirava por que essas pescas tinham sido vendidas ao Cunha brasileiro, há vinte anos, na mocidade do Sr. D. Jacinto. E hoje, segundo D. Teotónio, não valiam dois mil-réis. Se já não há sáveis!... E a propósito das antigas pescas do Douro se iam formando, em torno da mesa, entre os homens mais vizinhos, lentas cavaqueirinhas rurais, que as senhoras aproveitavam para cochichar, no desabafo daquele silêncio cerimonioso, que viera pesando cada vez mais desde a sopa até aos frangos guisados. Receoso de que essa orla de murmúrios lentos, sem brilho e sem alegria, se estabelecesse de novo, me abalancei (para animar), a interpelar Jacinto, recordando a famosa aventura do peixe da Dalmácia encalhado no ascensor.

— Isso foi uma das melhores histórias que nos sucederam em Paris! O Jacinto, por causa dum peixe muito raro, que lhe mandara o Grão-Duque Casimiro, dava uma magnífica ceia, a que o Grão-Duque... O Grão-Duque Casimiro, o irmão do Imperador...

Todos os olhos se desviaram para o meu Jacinto, que se servia de ervilhas: — e o Melo Rebelo quase se engasgou, num sorvo precipitado

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