A CIDADE E AS SERRAS

o seu procurador, o nédio e majestoso Lâporte. E enfim, seguido dum criado, que sobraçava um maço tremendo de jornais para lhe abastecer o cupé, o Príncipe da Grã-Ventura mergulhava na Cidade.


Quando o dia social de Jacinto se apresentava mais desafogado, e o céu de Março nos concedia caridosamente um pouco de azul aguado, saíamos depois de almoço, a pé, através de Paris. Estes lentos e errantes passeios eram outrora, na nossa idade de Estudantes, um gozo muito querido de Jacinto — porque neles mais intensamente e mais minuciosamente saboreava a Cidade. Agora porém, apesar da minha companhia, só lhe davam uma impaciência e uma fadiga que desoladoramente destoava do antigo, iluminado êxtase. Com espanto (mesmo com dor, porque sou bom, e sempre me entristece o desmoronar duma crença) descobri eu, na primeira tarde em que descemos aos Boulevards, que o denso formigueiro humano sobre o asfalto, e a torrente sombria dos trens sobre o macadame, afligiam o meu amigo pela brutalidade da sua pressa, do seu egoísmo, e do seu estridor. Encostado e como refugiado no meu braço, este Jacinto novo começou a lamentar que as ruas, na nossa Civilização, não fossem calçadas de guta-percha! E a guta-percha claramente representava, para o meu amigo, a substância discreta que amortece o choque e a rudeza das coisas! Oh maravilha! Jacinto querendo borracha, a borracha isoladora, entre a sua sensibilidade e as funções da Cidade! Depois,

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