A CIDADE E AS SERRAS

lânguida, como se o fio lhe murmurasse doçuras. Para desentorpecer arrisquei um passo tímido. Mas caiu logo sobre mim um chut severo do Grão-Duque! Recuei para entre as cortinas da janela, a abrigar a minha ociosidade. O Filólogo da Couraça, distante da mesa, com o seu comprido fio esticado, mordia o beiço, num esforço de penetração. A beatitude de S. Alteza, enterrado numa vasta poltrona, era perfeita. Ao lado o colo de Madame Verghane arfava como uma onda de leite. E o meu pobre Jacinto, numa aplicação conscienciosa, pendia sobre o Teatrofone tão tristemente como sobre uma sepultura.

Então, ante aqueles seres de superior civilização, sorvendo num silêncio devoto as obscenidades que a Gilberte lhes gania, por debaixo do solo de Paris, através de fios mergulhados nos esgotos, cingidos aos canos das fezes, — pensei na minha aldeia adormecida. O crescente de lua, que, seguido duma estrelinha, corria entre nuvens sobre os telhados e as chaminés negras dos Campos Elísios, também andava lá fugindo, mais lustrosa e mais doce, por cima dos pinheirais. As rãs coaxavam ao longe no Pego da Dona. A ermidinha de S. Joaquim branquejava no cabeço, nuazinha e cândida...

Uma das senhoras murmurou:

— Mas, não é a Gilberte!...

E um dos homens:

— Parece um cornetim...

— Agora são palmas...

— Não, é o Paulin!

O Grão-Duque lançou um chut feroz... No pátio da nossa casa ladravam os cães. De além

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