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a «um punhal traiçoeiro». Ao outro dia acordou com uma tosse leve. Indiferente porém aos resguardos, seguro duma robustez que afrontara tantos ares inclementes, foi a Fontainebleau com amigos no alto dum mail-coach. Logo nessa noite, ao recolher, teve um longo e intenso arrepio; e trinta horas depois, sem sofrimento, tão serenamente que durante algum tempo Smith o julgou adormecido, Fradique, como diziam os antigos, «tinha vivido». Não acaba mais docemente um belo dia de Verão.

O Dr. Labert declarou que fora uma forma raríssima de pleuris. E acrescentou, com um exato sentimento das felicidades humanas: -«Toujours de la chance, ce Fradique!»

Acompanharam a sua passagem derradeira pelas ruas de Paris, sob um céu cinzento de neve, alguns dos mais gloriosos homens de França nas coisas do saber e da arte. Lindos rostos, já pisados pelo tempo, o choraram, na saudade das emoções passadas. E, em pobres moradas, em torno a lares sem lume, foi decerto também lamentado este céptico de finas letras, que cuidava dos males humanos envolto em cabaias de seda

Jaz no Père-Lachaise, não longe da sepultura de Balzac, onde no dia dos Mortos ele mandava sempre colocar um ramo dessas violetas de Parma que tanto amara em vida o criador da Comédia Humana. Mãos fiéis, por seu turno, conservam sempre perfumado, de rosas frescas, o mármore simples que o cobre na terra.