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Fradique (noutra carta a J. Teixeira de Azevedo) fala dum polaco, G. Cornuski, professor e crítico, que escrevia na Revista Suíça, e que (diz Fradique) «constantemente sentia o seu gosto, muito pessoal e muito decidido, rebelar-se contra obras de Literatura e de Arte que a unanimidade crítica, desde séculos, tem consagrado como magistrais—a Gerusalemme Liberata do Tasso, as telas do Ticiano, as tragédias de Racine, as orações de Bossuet, os nossos Lusíadas e outros monumentos canonizados. Mas, sempre que a sua probidade de professor e de Crítico lhe impunha à proclamação da verdade, este homem robusto, sanguíneo, que heroicamente se batera em duas insurreições, tremia, pensava:—«Não! Por que será o meu critério mais seguro que o de tão finos entendimentos através dos tempos? Quem sabe? Talvez nessas obras exista a sublimidade— e só no meu espírito a impotência de a compreender». E o desgraçado Cornuski, com a alma mais triste que um crepúsculo de Outono, continuava diante dos coros da Athalie e das nudezas de Ticiano, a murmurar desconsoladamente:

—«Como é belo!»

Raros sofrem estas angústias críticas do desditoso Cornuski. Todos, porém, com risonha inconsciência, praticam o seu servilismo intelectual. Já, com efeito, porque o nosso espírito não possua a viril coragem de afrontar a autoridade daqueles a quem, tradicionalmente, atribui um critério mais firme e um saber mais alto; já porque as ideias estabelecidas, flutuando difusamente