A ILUSTRE CASA DE RAMIRES
339

das cousas, todos os seus defeitos se fundiam — os defeitos que tanto o horripilavam na tarde da Bica Santa, o rolar gordo da voz, o peito empinado, a ostentação de burgueza ricassa pinguemente repimpada na vida. Até já nem dizia — «o cavalheiro!» E alli, no adro melancolico de Craquêde, certamente parecia interessante e desejavel.

As senhoras desciam os dois degraus da Capella. Um melro esvoaçou na ramagem dos alamos. E Gonçalo encontrou o lampejo dos olhos serios de D. Anna que o procuravam.

— Peço perdão de não lhes ter offerecido agua benta á sahida, mas a concha está secca...

— Jesus, primo, que Egreja tão feia!

D. Anna arriscou, com timidez:

— Depois das ruinas e dos tumulos, até parece pouco religiosa.

A observação impressionou Gonçalo, como muito fina. E junto d’ella, demorando os passos com agrado, sentia, esparzido pelos seus movimentos, pelo roçar do vestido, um aroma tambem fino, que não era o da horrenda agua de Colonia da botica do Pires. Em silencio, sob a ramagem das carvalhas, caminharam para a caleche, onde o cocheiro se aprumára, bem estilado, tirando o chapeu. Gonçalo notou que elle rapára o bigode. E a parelha reluzia, atrelada com esmero.