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A ILUSTRE CASA DE RAMIRES

O enorme senhor de Santa Ireneia parára, pousando no genro os olhos duros, sob a ruga das sobrancelhas, hirsutas e brancas como sarças em manhã de geada:

— Irei a Monte-mór, Mendo Paes, mas levar o meu sangue e o dos meus para que justiça logre quem justiça tem.

Então Mendo Paes, amargurado, ante a heroica teima:

— Maior dó, maior dó! Será bom sangue de Ricos-homens vertido por más desfórras... Senhor Tructesindo Ramires, sabei que em Canta-Pedra vos espera Lopo de Baião, o Bastardo, para vos tolher a passagem com cem lanças!

Tructesindo ergueu a vasta face — com um riso tão soberbo e claro que os alões rosnaram torvamente, e, acordando, o falcão esticou a aza lenta:

— Boa nova e de boa esperança! E, dizei, senhor Mordomo-mór da Curia, tão de feição e certa assim m’a trazeis para me intimidar?

— Para vos intimidar?... Nem o Senhor Archanjo S. Miguel vos intimidaria descendo do céo com toda a sua hoste e a sua espada de lume! De sobra o sei, senhor Tructesindo Ramires. Mas casei na vossa casa. E já que n’esta lide não sereis por mim bem ajudado, quero, ao menos, que sejaes bem avisado.