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curiosas dilettantezinhas que se ufanavam de saber rimar e inventar motes, quadras, trovas.

Uma vez, quando as intimas a importunavam com pedidos reiterados para que tomasse parte num torneio poetico, replicou, com voz melodiosa, mas bastante decidida:

Se soubera fazer trovas
de que me satisfizera...
inda assim as não fizera. 258

Podia ser d'ella o famoso suelto: no tan simple que no haga una, ni tan loca que haga dos 259, ou o aphorismo: hacer una es entendimiento; y muchas, parto de necedad. 260

Verdade é que apesar d’estas recusas formaes não se livrou totalmente de ver o seu nome em cancioneiros de mão. 261 Um cantar alheio, por ella entoado em triste solidão, e colhido de ouvido por algum aulico, logo passava a ser assente como obra «da nossa Infanta», em cadernos de lembranças, sendo tresladado, repetido, glosado, cantado em todo o paiz.

Sei de um, não posterior ao anno 1549, que encontrei consignado em uma Miscellanea, como desabafo melancholico Da Infanta D. Maria que nunca teve dita para casar, sendo grande senhora. E diz:

Já não posso ser contente,
tenho a esperança perdida.
Ando perdida entre a gente,
nem mouro, nem tenho vida.

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Sei tambem de diversos lyricos de boa veia que paraphrasearam esta copla, julgando-se «vencidos da vida», em momentos de tristeza. Dois são magnates coevos: o velho conde de Vimioso e Francisco de Sá de Meneses. Outro é um anonymo do Cancioneiro de Evora. Seguem poetas de profissão: Luis de Camões e seu emulo, o suave cantor do Lima, Diogo Bernardes. Além d’essas posso apontar glosas de seiscentistas como Francisco Rodrigues Lobo na sua Primavera, e Simão Machado, na interessante peça magica Alfea. Todos elles sem nomearem a Infanta, fallando apenas de um Mote alheio. Emquanto não se descobrir um nome de auctor, anterior á Infanta, não é illicito todavia propagar a quadra como da sua lavra, tendo em conta de obra de D. Maria tambem a Volta seguinte, que é anonyma e falia em nome de uma mulher:

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