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parecia endemoninhado. Não via, não ouvia, não sentia, não tinha consciencia de si, nem dos seus actos; todo elle era fogo, delirio, convulsão, febre, loucura. Parecia que poderosas correntes electricas se transmittiam do tambor ao cerebro, e do cerebro ao tambor, desafiando aquelles movimentos choreicos, aquelles grunhidos surdos, aquellas visagens extravagantes, aquellas contracções geraes, que o torciam, desconjunctavam e desfiguravam.

Vencera-o completamente a febre; sangue, nervös, músculos, cerebro, tudo era dominio seu; congestionado, allucinado, louco, rufou, rufou, rufou com desespero, rufou até as baquetas se não avistarem, de rapidas que se moviam; rufou até o ouvido quasi não perceber a descontinuidade dos sons; rufou finalmente até cair por terra exhausto, no collapso que succède ás convulsões do espasmo. Se tinha de ser aquelle o declinar de uma gloria, todos os astros lhe invejariam tão espléndido crepúsculo.

O povo inteiro applaudiu o artista.

E quando voltaram a si do extase em que elle os tivera, acharam já fechadas as portas da sacristía e nem vestigios da familia do Mosteiro. O povo dispersou pacificamente.

 

XX


Passados dias voltava o Herodes do Porto, quando nas proximidades da aldeia encontrou alguns homens a cavallo, que lhe eram desconhecidos.

O leitor que tenha sempre vívido n’uma cidade populosa, onde lhe é impossivel conhecer todos os que com elle habitam na mesma terra, mal pode fazer ideia da sensação que produz no habitante de