Dona Benta admirou-se da complicação.
— Sim, disse ela, mas já que o senhor poude chegar até cá, creio que a linha telefonica não é mais necessaria.
O detective sorriu da ingenuidade da velha, e explicou que o material já havia chegado e que portanto a linha ia ser construida. Terminou piscando o olho vermelho e dizendo: “O governo sabe o que faz, minha senhora”. [1]
— Pois façam lá como entenderem, concluiu dona Benta. Não entendo de governos, nem quero entender. Aqui estamos nós para prestar aos senhores toda a ajuda possivel. O que quero é que me livrem desse animalão quanto antes.
96
- ↑ Para custear as despesas do Serviço Federal de Caça ao Rinoceronte, o nosso bom Governo creou um selo novo — o Selo do Rinoceronte. Todas as cartas que a gente punha no correio e todos os recibos e mais documentos que a gente assinava tinha que vir com o Selo do Rinoceronte, ao lado do Selo da Educação e do Selo Santos Dumont. O resultado foi que o povo brasileiro, que já andava com a lingua seca de tanto lamber selos, teve de espremer as glandulas que produzem a saliva e chamar medicos de fóra que viessem estudar os meios de aumentar-lhes a secreção.
Desde essa ocasião começou a aparecer no Brasil uma doença nova — secura de lingua por escassez de saliva. As pessoas ricas ainda se arranjavam, andando acompanhadas de serventes denominados — os Linguas. Eram rapazes cuja unica função consistia em pôrem a lingua de fóra sempre que os patrões tivessem de pregar os inumeros selos que o Governo se divertia em crear — como o Selo Ruy Barbosa, o Selo da Integração Revolucionaria da America. do Sul, o Selo João Pessoa e outros.
Por essa época Emilia teve a lembrança de montar uma fabrica para a produção de saliva artificial, que seria vendida em garrafões por um preço bastante razoavel. A idéa falhou. O Governo ficou furioso com a boneca por julgar aquilo uma critica ao seu maravilhoso sistema selifero, e votou uma lei carrancuda, declarando que selo pregado com saliva artificial não valia. Foi uma pena...