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Valdir Ramalho

mar o grau de confiabilidade dessas informações. Seja como for, Fonseca proporcionou o esqueleto de quase todas as biografias de Santos Dumont que vieram depois.

Pelo que parece, ainda não apareceram trabalhos de historiadores profissionais, com capacitação e experiência para examinar com espírito crítico e vincular sistematicamente as fontes primárias, os documentos, os informantes, às informações que são dadas. Faltam também livros de pesquisa da história da tecnologia, abarcando os problemas técnicos que entretinham os pioneiros da aeronáutica, as características dos aparelhos que foram construídos e sua evolução.

Desconhece-se, em termos técnicos, em detalhe, exatamente o que foi que Santos Dumont concebeu ou produziu, bem como o que ele adotou ou adaptou de outros. O elementar, a lista de balões e aparelhos aéreos que Santos Dumont projetou ou fez construir, tem lacunas que não se explicam, inconsistências e dados implausíveis. Há tendência dos biógrafos históricos de atribuir-lhe prioridade de qualquer coisa que se vê que ele utilizou; mas logo se notam erros históricos grosseiros (como de que ele teria criado o primeiro hangar do mundo, teria inventado a asa delta) ou atribuições implausíveis e sem evidência (como de que ele teria projetado um relógio).

E quanto a descobrir até que ponto o indivíduo Santos representa o Brasil, até que ponto ele foi um brasileiro típico em suas atitudes e hábitos mentais, ou em contraste, em que extensão ele foi um ser fora do comum, possivelmente liberto de supostos vícios e mazelas brasileiras? Ao mesmo tempo, o que se pode aprender sobre o Brasil, a partir da vida de Santos? Naturalmente, nisso imiscui-se a difícil questão correlata de comparar o Brasil de hoje com o de sua época. A literatura brasileira sobre Santos não encara de frente e seriamente essas questões.

Agradecimentos. O autor é grato ao CNPQ, por bolsa de programa de pós-doutorado no Center for Philosophy and History of Science, Universidade de Boston; e a esta universidade, em particular a Robert S. Cohen, diretor do Centro, que lhe proporcionou anos adicionais como Research Associate. Este texto é fruto tardio de estudos começados no Centro. Também é grato aos repositórios de material para este trabalho, citando pelo menos o Dibner Institute for the History of Science and Technology (na época, no MIT), a Boston Public Library, o Museu Aeroespacial de Campos dos Afonsos, o Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica e a Biblioteca Nacional. Os juízos aqui emitidos são do autor, não de qualquer instituição.

Valdir' Ramalho

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)

SAE/Presidência da República, Brasil.

val3ram@gmail.com

The historical biographies of Santos Dumont

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scientiæ studia, São Paulo, v. 11, n. 3, p. 687-705, 2013