esfera, onde mais se encontram precipícios do sossego, que firmeza nos favores da fortuna! E quando não houvesse maior causa para fazer horror o falso prazer de reinar, basta ver que ordinariamente do de quem mais nos fiamos são as brechas, por onde se rende a fortaleza do mais justo Monarca, os sentinelas que vigiam os nossos descuidos, os espias do engano, os escudos dos maus, se as armas dos indígnos. E como é possível que resistamos ao fogo, que nos faz a malícia destes, se nos acham descuidados? Com a boa fé nos enganam, e com fingimentos nos prendem, conspiraram contra os nossos créditos lisonjeiros, mentirosos, traidores, e fingidos; porque (entre outros motivos) o degenerar a justa veneração, que se deve às Majestades, produzir o veneno do respeito, que desfigura a verdade em chegando à presença dos soberanos, que a desconheceriam despida, porque se a vêem é com adronos.

“Onde irei, senhor, que encontre quem desconheça a grandeza, e me diga quanto sente? Onde acharei um amigo tão nobre, que me aconselhe sem se haver aconselhado com o próprio interesse? Onde acharei um homem tão leal, que amando só os meus acertos, suspenda o peso, que me oprime, sem que faça maior preso arrastado pelo ódio?