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CARTAS DE INGLATERRA

que vão desenterrando e colleccionando atravéz de in-folios e bibliothecas casos curiosos e archaicos de historia e de litteratura.

Benjamin Disraeli nasceu por isso entre os livros — litteralmente entre os livros, porque a casa em que viviam os Disraeli offerecia o espaço de uma boceta, e no quarto da creança, entre a accumulação vetusta dos calhamaços, havia apenas espaço para uma cadeira e para um berço. O velho Disraeli era judeu: mas felizmente para os destinos futuros de seu filho rompeu com a synagoga, e todos os Disraeli se fizeram christãos. Benjamin tinha então dezessete annos, e o seu padrinho na pia baptismal foi um certo Samuel Rogers, notavel por ser ao mesmo tempo um dos mais ricos banqueiros da City e um dos poetas mais elegiacos do seu tempo — e notavel ainda por não ficar na historia, nem como banqueiro, nem como poeta, mas como um requintado gourmet, o grande Lucullus de Londres, que deu os mais celebres, os mais finos jantares da Europa.

Assim marcado com o rotulo christão, Benjamin Disraeli largou a caminhar pela vida fóra, mas foi encalhar bem depressa n’um cartorio de tabellião — onde se diz que, durante dous annos, este moço orgulhoso, que já então se considerava um semi-deus, redigiu procurações e testamentos. Com a mesma penna, porém, ia escrevendo Vivian Grey: e da tempestuosa