— Porque não dança, senhora D. Angelina? perguntou jovialmente a voz de Gastão. Se eu lhe pedir que seja meu par, recusa-me?
— Recuso, respondeu ella docemente, e uma côr viva tingiu-lhe as faces.
Recuso por muitas razões. Em primeiro lugar é um pouco extranho dançar quando se tem a posição que eu tenho, porque emfim eu não sou mais que uma dame de compagnie, uma aia, uma governante ou como queiram chamar-me, de casa dos meus caridosos parentes. — Ao dizer isto, talvez involuntariamente, na voz de Angelina havia umas inflexões de amargura resignada.
— Depois — continuou — não danço porque me faria mal. Dóe-me muito o peito!
Gastão sentiu dentro d’alma como que a brotar subitamente, um sentimento que lhe era desconhecido e em que havia dó, tristeza, admiração, um enternecimento sem nome que lhe embargava a voz.
Angelina era tão delgada, tão fragil, d’uma physionomia tão delicadamente melancolica!
Para tudo a fizera o destino, menos para combater e para luctar. A desgraça despedaçara-a sem que ella tentasse resistir-lhe sequer.
Como seria doce protegel-a, guial-a na vida, abrigal-a no peito contra os embates hostis da adversidade!