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CONTOS BRASILEIROS


Estava já grizalho, mas não tinha
Esses pés de gallinha
A que no mundo pouca gente escapa,
E que o aspecto dão a nossa cara
De castanha ou de mappa.
E’ que a pelle, que estica,
Livre de sulcos mais ou menos fica,
E o Sá (era esse o nome
Do heróe dessa novella)
Si havia sido em moço um magricela
E padecido fome,
Teve, afinal, socego
Quando, volvidos os quarenta annos,
Num succulento emprego.
Fez boas digestões, dormiu bons somnos,
E entrou, como entra um passaro, na muda.
Tanto corpo deitou, engordou tanto,
Que era um Deus-nos-acuda,
E até causava a toda a gente espanto.
Os amigos de outr’ora
Não n’o reconheciam,
Quando sereno por acaso o viam
Medindo os passos pela rua afóra,
Respirando virtude
E vendendo saude.

No emtanto, que passado!
Que existencia infeliz de aventureiro!
Actor, continuo, sacristão, soldado,
Negociante, jogador, fixeiro,