olhos habeis. A fallar verdade, o unico defeito que Mendonça lhe achou foi a côr dos olhos, não porque a côr fosse feia, mas porque elle tinha prevenção contra os olhos verdes. A prevenção, cumpre dizêl-o, era mais litteraria que outra cousa ; Mendonça apegava-se á phrase que uma vez proferíra, e foi acima citada, e a phrase é que lhe produzio a prevenção. Não m’o accusem de chofre ; Mendonça era homem intelligente, instruido e dotado de bom senso ; tinha, além d’isso, grande tendencia para as affeições romanticas; mas apezar disso lá tinha calcanhar o nosso Achilles. Era homem como os outros ; outros Achilles andão por ahi que são da cabeça aos pés um immenso calcanhar. O ponto vulneravel de Mendonça era esse ; o amor de uma phrase era capaz de violentar-lhe affectos; sacrificava uma situação a um periodo arredondado.
Referindo a um amigo o episodio da galga e a entrevista com Margarida, Mendonça disse que poderia vir a gostar d’ella se não tivesse olhos verdes. O amigo rio com certo ar de sarcasmo.
— Mas, doutor, disse-lhe elle, não comprehendo essa prevenção; eu ouço até dizer que os olhos verdes são de ordinario nuncios de boa alma. Além de que, a côr dos olhos não vale nada, a questão é a expressão d’elles. Podem ser azues como o céo e perfidos como o mar.