Cortejou-me, não fria, mas séria; foi até a janela, e veio depois sentar-se ao piano. Enquanto eu continuava a conversar com D. Leocádia, suas mãos corriam lentamente pelo teclado, que exalava uns arpejos frouxos e dolentes.
D. Leocádia saíra um instante.
O piano calou-se, enfim. Eu vi Emília de pé no meio da sala, hesitando no passo que a devia aproximar de mim:
— Perdoe-me! disse-me ela.
E a voz com que o disse tinha modulações sublimes.
— Sei agora quanto o ofendi! Não sabia então quanto lhe devo! Minha tia contou-me...
— A senhora nada me deve, D. Emília. Estou pago! Já recebi o meu salário. Foi o preço de uma gratidão que tanto a incomodava!
— Não me diga isso! Seja sempre generoso!
— Quem deve sou eu. Um doente rico tem à sua disposição todos os médicos e os melhores; mas, para um médico principiante e desconhecido, um doente que paga bem é uma fortuna!
— Eu mereci estas palavras, porque fui má e injusta... Fui até sem delicadeza!... Mas se lhe confessasse... teria pena de mim!
— Confessar-me o quê, D. Emília? perguntei comovido.
A tia voltava.
— Logo!...
Ela articulou essa palavra, já calma e sem o menor vexame, com a voz tão clara, que D. Leocádia devia ter ouvido.