De resto, talvez toda esta gente ande bem avisadamente em admirar, sem iniciativa propria, as obras de arte, que os criticos lhe mandam admirar. Ha aqui uma reserva e economia de força pensante, que bem póde ser louvavel. N’esta nossa atulhada civilisação, em que tão continuos esforços são exigidos de cada homem para que lhe possa caber a sua fatia de pão no famoso «banquete da vida», parece realmente excessivo que elle se sobrecarregue ainda com o trabalho de conceber e formular opiniões estheticas. Um amanuense das finanças, que nascera com espirito, dizia outr’ora a Voltaire: — «É para mim uma grande infelicidade, mas nunca me sobrou tempo para ter bom gosto!» Palavra triste e profunda: — e que, se já era verdadeira no seculo XVIII, quanto mais exacta é no seculo XIX! Para ter um gosto proprio e julgar com alguma finura das cousas d’arte, é necessaria uma preparação, uma cultura adequada. E onde tem o homem de trabalho, no nosso tempo, vagares para essa complicada educação, que exige viagens, mil leituras e longa frequentação dos museus, todo um afinamento particular do espirito? Os proprios ociosos não têm tempo — porque, como se sabe, não ha profissão mais absorvente do que a vadiagem. Os interesses, os negocios, a loja, a repartição, a familia, a profissão liberal, os prazeres não deixam um momento para as exigencias de uma iniciação artistica: — e n’uma cidade de dous milhões de almas, como Pariz,