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tinho —”Eu sou o aspide sagrado que tem fome, que te pica, que te envenena, que te estrangula, que te domina, que te immortaliza...” — E seus coleios se acceleravam desordenados, sem medida até que exhausta, caiu curvada em fórma de baculo, como essas folhas que surgem para a vida...

O senso de Theophilo se estagnara, entorpecera. Era Ladice quem creava n´elle, quem lhe regia a vontade, quem lhe era o motivo extuante. Amou-a com a excessividade de sua natureza de hysterico e de romantico. Nunca Theophilo a sentiu tão subtil e tão mysteriosamente implacavel. De joelhos alucinado agarrando-a pelo vestido, abraçando-lhe os pés com a ternura voraz, submissa, delirante, dos cabellos de Magdalena, elle lhe implorava: “Fica”, “fica” — “Es pera, ainda não”...—E os olhos de sua amante se volviam para elle pesados, obliquos, com a graça morbida, dos gestos que desapparecem.

— Amanhã, Thêo, quero amar-te, rodeada de rosas rubras, que me lembrem o teu sangue coagulado...

A phantasia de Ladice se açacalava. Ao sair, já no jardim, segurando as mãos do Poeta, disse-lhe dolorosa:

— Ah! Thêo, que tarde lenta... dir-se-ia um lirio enorme, cujas petalas se fecham uma após outra...— com vivacidade — e eu Thêo, sou o seu estylete, o seu estame, a sua anthera vibratil. — E ella parou como se ouvisse em o silencio as vozes multiformes da creação.