demencia do homem que ousasse vaticinar que antes de meio seculo um punhado d’entre os vencidos reivindicam victoriosa mente uma parte do território perdido, como primicias de triumphos ainda mais relevantes, até que por fim a antiga capital dos reis wisigodos fosse de novo o assento predilecto da côrte dos seus netos coroados.
Não vamos provar a paciência do benevolo leitor, repetindo aqui o que se acha consignado nas narrativas que tratam da quéda dos godos e invasão dos sarracenos em Hespanha. Mas afim de facilitar a prompta intelligencia de allusões que se acharão disseminadas pelas paginas deste livro, não será, talvez, fóra de propósito recordar n’ um esboço rapido a origem e progresso do reino neo-gothico das Asturias, até á epoca a que se referem os successos que fazem o assumpto do romance.
Vendo a patria irremediavelmente perdida, e seguro o domínio dos conquistadores, determinaram muitos wisigodos procurar um asylo nas montanhas do norte para escaparem ao jugo estrangeiro; ao passo que outros com o mesmo fim se reuniram a Theodomiro, que em Murcia conseguira estabelecer um pequeno estado independente. Com quanto este ultimo tivesse a garantia de um pacto celebrado entre aquelle chefe e Abdelaziz, de pouco lhe serviu pelo tempo adiante, não chegando aquelle estado a completar meio século de evistençia.
Não succedeu o mesmo com a nação que se ia formando no norte. A aspereza das brenhas asturianas, cujo ingresso oppunha tantas difficuldades a um exercito, e a pobreza da terra e dos seus habitantes, parece que deviam ter affiançado a estes uma tranquillidade obscura, attento o desprezo que aos capitães arabes havia de ter merecido este ultimo recanto da Península. Consta todavia que poucos annos depois da conquista, o wali Ayub ben Habib mandou contra aquelle território alguns destacamentos de tropa que tomaram varias povoações, estabelecendo-se em Gijon. Foi então que os asturianos se sublevaram.
Tinham escolhido por chefe a Pelagio, cuja geneologia não é certa, posto que haja quem o chame filho de Favila, duque de Cantabria e descendente do rei Chindaswinth. Em vida de Roderico, ultimo dos reis wisigodos, achava-se a
