quirido pelo estudo; mas faltava-lhe a austeridade de costumes do prelado portuense. De genio, talvez, tão violento como este, sabía-o reprimir melhor, e posto que não igualasse na sciencia de simular equanimidade e ternura o inquisidor d’Évora, tinha arte de as fingir nas occasiões em que a falta dos ademanes e esgares pios e de uma linguagem agri-doce podesse compromettê-lo na opinião popular. Como Pedro Alvares de Paredes, João de Mello amava a plausibilidade.
Entretanto, debaixo dos tectos da Inquisição de Lisboa repetiam-se as mesmas scenas de corrupção e de maldade que se representavam por outras partes. A dar credito aos christãos-novos, aqui o segredo era maior, maior a falta de communicações para os desgraçados que cahiam nas mãos dos inquisidores. Por tristes e infectas que fossem as famosas covas de Évora, a soledade nos carceres de Lisboa era mais completa. Nem um raio de luz nocturna ou diurna transsudava jámais nessas lobregas moradas, e a unica voz que por vezes ouvia qualquer novo habitante daquella especie de sepulchros era a dos ministros do tribunal, que desciam a consolá-lo para que pedisse misericordia, asseverando-lhe que a existencia das suas enormes culpas es-