A RAINHA MABE
19

luar. O cocheiro é um mosquitinho de libré castanha, tão pequeno que mais parece não sei o que...

— Borrachudo! — gritou Emília. — Mosquitinho pequeno assim, só o borrachudo.

— O chicotinho que ele usava — continuou Dona Benta, era um pêlo finíssimo atado à ponta dum osso de pernilongo.

— Que galanteza, vovó! E quem construiu semelhante miminho de carruagem?

— Conta Shakespeare que quem a burilou numa casca de avelã foi o marceneiro Serelepe, de combinação com mestre Besouro, o qual sempre foi o serralheiro das fadas desde os tempos mais remotos.

— E que faz a Rainha Mabe, vovó?

— Coisas lindas! Todas as noites — diz Shakespeare — galopa em sua carruagenzinha pela cabeça dos namorados, desabrochando os mais lindos sonhos de amor. Se corre pela perna dum político que está cochilando numa preguiçosa. o homem sonha com a vice-presidência da República ou o lugar de primeiro-ministro. Se corre por cima dos dedos de um advogado, ele sonha com fabulosas remunerações das causas ganhas. Se passa por cima dos lábios duma jovem apaixonada, ela sonha com beijos e mais beijos; e se nesses momentos sente nesses lábios um gostinho de qualquer coisa, comida de sal ou doce, dá ordem ao cocheirinho para chicoteá-los sem dó.

— Que graça! exclamou a menina.

Não adicionar a ilustração.