Saímos, afinal, e levei-o a uma sapataria próxima. Mostrei ao sapateiro a bota que atrasava. "Pode consertar isto?" O homem abriu a boca. Não me entendeu. De repente desconfiou, avermelhou e me pediu que saísse de sua casa porque não era "brincadeira de moleques". Saímos, indignados, e fomos em procura de outro — e assim visitamos todos os sapateiros do bairro. Pouco adiantou. Só sabiam botar meias solas e saltos; de atraso nenhum entendia. Um deles disse: "Isso de atraso, só com os relojoeiros."
Fui a um relojoeiro.
— O senhor, que sabe tão bem consertar os relógios, talvez nos possa dar uma arrumação nesta botinha.
— Que tem ela?
— Está atrasando seis léguas.
O relojoeiro me olhou com tal cara que resolvi botar espaço entre mim e ele — e sumi da sua presença.
Cocei a cabeça. Procurar outro era inútil. Todos haviam de nos dar a mesma acolhida. Fiquei perplexo, sem saber o que aconselhar ao meu amiguinho.
— Não sei, Polegar. Nesta cidade parece que ninguém conserta atraso de bota, e sem que o seu par de botas funcione perfeitamente você não se arruma neste mundo. Fica sem defesa.
Passamos um minuto pensando no caso. Súbito, um clarão me iluminou o cérebro: Emília!... Sim, só Emília seria capaz de dar um jeito naquilo, como dera em tantos problemas aparentemente insolúveis.
— Polegar, disse eu — o único remédio que vejo é irmos ao Sítio do Picapau Amarelo conversar com Emília. A diabinha tem feito tanta coisa maravilhosa, que é bem capaz de fazer mais uma. Emília é uma danada!
Polegar já havia estado no Picapau Amarelo e se dava muito bem com Emília, da qual havia recebido um presentinho: o pito de barro de tia Nastácia, "para esconder-se dentro quando fosse preciso".
— Pois vamos, foi a sua resposta. Estou com saudades dela. Ainda é marquesa?