descabida toda a convenção no assunto do amor e do crime de Valentim.

A conversa versou portanto sobre coisa diferente e estranha daquela, mostrando-se Davi, o mais que pôde, ignorante do passado de Emília.

Davi despediu-se e voltou para casa.

Vicente e Emília insistiram para que ele lá voltasse, e Davi prometeu.

E, com efeito, durante oito dias, Davi fazia regularmente uma visita diária ao amigo e vizinho.

Mas no fim de oito dias Davi não foi lá, nem deu sinais de si.

Durante dois dias conservou-se a casa fechada; mal aparecia, uma ou outra vez o criado Elói.

Vicente cuidou que o poeta estivesse doente, e lá foi. Elói apareceu e disse que o poeta tinha saído declarando que não voltaria antes de dois meses. Entretanto, deixara uma carta para ser entregue a Vicente.

Vicente recebeu a carta e foi lê-la em casa.

Dizia o poeta:

Meu caro amigo. Esta carta dar-lhe-á notícia, quando aí for, de que eu me ausento por dois meses.

Os motivos desta ausência são particulares. Talvez lhos diga depois. O que lhe peço é que, no caso de mudar de casa, faça-me chegar a notícia exata da sua nova residência.

Adeus; até breve. — Davi, poeta para si, amigo para Vicente, estranho para toda a humanidade.

Vicente leu esta carta a Emília, e lamentou com ela a repentina saída de Davi.

— Era o meu único amigo, e esse mesmo me falta.

— Mas, por dois meses...

— Eu sei lá... Dois meses... Também...

Vicente concluiu mentalmente a frase que dizia respeito a Valentim.

Entretanto voltaram os dois às funções regulares da horta e da costura, à espera que chegasse o dia da volta do poeta.

Tudo continuou, portanto, como outrora.

Não durou, porém, isto mais do que quinze dias, ao cabo dos quais Vicente adoeceu.

Foi o sinal da agitação naquela família, que tão sossegada e silenciosamente vivia.

Emília, assustada ao princípio com os sintomas de uma grave enfermidade para seu pai, quis ir ela própria chamar o médico.

Vicente disse-lhe que chamasse antes o criado de Davi, e que por caridade este se prestaria a isso.